Joana, 70 anos, dona de casa, ensino fundamental completo, é viúva, possui três filhos, sendo dois homens, João e Pedro, e uma mulher, Juliana. Todos casados e residentes em cidades distintas da que reside a mãe, a pelo menos 40 km. Os filhos a visitam pelo menos uma vez por mês e procuram alternar as datas de modo que Joana não fique por muito tempo sem vê-los. Porém, a visita recente do filho mais velho (João), o fez notar algumas diferenças em Joana. Quando ele a perguntou como tinha sido a semana, ela disse: “fui naquele homem; ele me deu alguns remédios, agora eu vou ter que tomar isso p’ra aquilo. Ele falou que isso vai me ajudar a fazer as coisas, a mexer melhor naquelas coisas. Quando minha irmã (Juliana, a filha) chegar, eu vou falar para ela colocar o lobo na mesa e passar o café p’ra você. E… oh… antes de você ir embora, pega o tapix e deixa seu número de telefone, que eu vou discar p’ra você”. João estranhou as expressões da mãe e recorreu aos irmãos; perguntou se notaram alterações em sua mãe. Juliana relatou que ela (Joana) saiu de casa, afirmando que ia comprar ovos e chegou com sabão, enquanto Pedro disse que ela chamava seu filho (neto de Joana) o tempo todo de José, marido falecido e pai dos filhos de Joana. Os três resolveram acompanhar a mãe ao médico para compreender o que se passava.
Embora haja pequenas divergências entre os manuais de classificação diagnóstica, a CID geralmente recomenda pelo menos dois domínios comprometidos para o diagnóstico de casos como o de Joana. Considerando isso, o diagnóstico provável é:
- A) Síndrome demencial.
- B) Doença de Alzheimer.
- C) Doença cerebrovascular.
- D) Transtorno neurocognitivo maior.
- E) Degeneração lobar frontotemporal.
Resposta:
A alternativa correta é letra D) Transtorno neurocognitivo maior.
Gabarito: Letra D
Embora haja pequenas divergências entre os manuais de classificação diagnóstica, a CID geralmente recomenda pelo menos dois domínios comprometidos para o diagnóstico de casos como o de Joana. Considerando isso, o diagnóstico provável é:
a) Síndrome demencial.
b) Doença de Alzheimer.
c) Doença cerebrovascular.
d) Transtorno neurocognitivo maior.
e) Degeneração lobar frontotemporal.
Doença de Alzheimer, doença vascular são exemplos de transtorno neurocognitivo maior, que se diferenciam pela sua etiologia. Como não temos informações sobre a etiologia do quadro de Joana, podemos apenas afirmar que seu diagnóstico provável é de transtorno neurocognitivo maior.
“Transtorno neurocognitivo maior. O transtorno neurocognitivo maior (um termo que pode ser usado como sinônimo de demência, que ainda é preferido pela maioria dos psiquiatras) é marcado por comprometimento grave na memória, no julgamento, na orientação e na cognição. Existem 13 subtipos (Tab. 6-2): doença de Alzheimer, que geralmente ocorre em pessoas com mais de 65 anos e se manifesta por deterioração intelectual progressiva e demência; demência vascular, que é uma progressão em etapas na deterioração cognitiva causada por trombose ou hemorragia dos vasos; degeneração lobar frontotemporal, que é marcada por inibição comportamental (também conhecida como doença de Pick); doença com corpos de Lewy, que envolve alucinações com demência; lesão cerebral traumática por trauma físico; infecção por HIV; doença do príon; doença de Parkinson, doença de Huntington; causado por uma condição médica; induzido por substância/medicamento (p.ex., álcool, causando síndrome de Korsakoff); múltiplas etiologias; e demência não especificada.
“A demência, também denominada transtorno neurocognitivo maior na 5 a edição do DSM (DSM-5), caracteriza-se por prejuízo grave na memória, no julgamento, na orientação e na cognição. As subcategorias são: (1) doença de Alzheimer, que normalmente ocorre em indivíduos com idade superior a 65 anos e se manifesta pela desorientação intelectual progressiva e demência, delírios ou depressão; (2) doença vascular, causada por trombose ou hemorragia dos vasos sanguíneos; (3) infecção por HIV; (4) lesão cerebral traumática; (5) degeneração lobar frontotemporal ou doença de Pick; (6) doença do príon, como doença de Creutzfeldt-Jakob, a qual é causada por um vírus transmissível de crescimento lento; (7) induzida por substância, causada por toxina ou medicamento (p. ex., vapores de gasolina, atropina); (8) etiologias múltiplas; e (9) não especificada.”
“Demência refere-se a um processo de doença marcado pelo declínio cognitivo, mas com clareza de consciência. A demência não se refere a um baixo funcionamento intelectual, nem retardo mental, porque estas são condições de desenvolvimento e estáticas, e os déficits cognitivos na demência representam um declínio de níveis anteriores de funcionamento. A demência envolve múltiplos domínios cognitivos, e déficits cognitivos causam prejuízo significativo no funcionamento social e profissional. Existem vários tipos de demência com base na etiologia: doença de Alzheimer, demência com corpos de Lewy, demência vascular, demência frontotemporal, lesão cerebral traumática (LCT), HIV, doença do príon, doença de Parkinson e doença de Huntington. A demência também pode ser causada por outras condições médicas ou neurológicas ou produzida por várias substâncias (veja a Seção 21.4: Transtornos Amnésticos). Os pontos clínicos críticos da demência são a identificação da síndrome e o exame clínico de sua causa. O transtorno pode ser progressivo ou estático; permanente ou reversível. Presume-se sempre uma causa subjacente, embora, em casos raros, seja impossível determinar uma causa específica. O potencial de reversão da demência está relacionado à condição patológica subjacente e à disponibilidade e aplicação de um tratamento eficaz. Aproximadamente 15% das pessoas com demência apresentam doenças reversíveis, se o tratamento for iniciado antes que ocorram danos irreparáveis.”
"DEMÊNCIAS OU TRANSTORNO NEUROCOGNITIVO MAIOR Nas demências ou síndromes demenciais (TNCs maiores), costuma haver, de modo geral, empobrecimento e simplificação progressiva de todos os processos psíquicos, cognitivos e afetivos. Segundo a CID-11 (2018) e o DSM-5, a demência se caracteriza por ser uma síndrome mental orgânica na qual o indivíduo apresenta: Declínio do funcionamento cognitivo prévio, em domínios cognitivos como memória, linguagem, funções executivas, julgamento, atenção, velocidade de processamento, cognição social, velocidade psicomotora e habilidades visuoespaciais ou visuoperceptivas (apresentados no Quadro 39.1). Esse declínio surge frequentemente como preocupação de uma pessoa que convive com o paciente (esposa, marido, filhos, amigos, entre outras), que nota seu declínio. Pode ser (mas é menos frequente) que o declínio seja notado pelo próprio paciente (isso ocorre, sobretudo, no CCL que precede a demência ou nos estágios iniciais de demência leve). Também é importante que o declínio seja avaliado e documentado por meio de testes neuropsicológicos padronizados, realizados por profissional com formação adequada (de modo geral, psicólogo com alguma formação em diagnóstico neuropsicológico). Como mencionado anteriormente, a CID-11 (assim como o DSM-5) não mais exige que haja perda da memória para o diagnóstico de demência; entretanto, o declínio da memória é frequentemente um dos elementos centrais da maior parte desses quadros (com exceção da demência por degeneração lobar frontotemporal, na qual, sobretudo em suas fases iniciais, há preservação relativa da memória, da aprendizagem e da função perceptomotora). O déficit de memória implica a memória imediata (conceituada por alguns autores como memória de trabalho) e a memória recente, classicamente 2. 3. 4. incluídas na memória de fixação. Apenas em fases avançadas há perda da memória remota e da capacidade de evocação. As perdas de memória seguem, de modo geral, a lei de Ribot (ver capítulo sobre memória). O declínio cognitivo não deve ser atribuído ao envelhecimento normal. O declínio cognitivo do envelhecimento normal afeta, principalmente, a velocidade de processamento. Deve-se sempre suspeitar de declínio cognitivo patológico quando ele afeta outros domínios cognitivos, além da velocidade de processamento. Para diferenciar mais minuciosamente o declínio cognitivo normal do patológico, são necessários testes cognitivos validados e calibrados para idade, sexo e escolaridade do paciente. O declínio cognitivo deve interferir significativamente na independência do indivíduo em sua vida diária, em sua autonomia. O paciente precisa de ajuda para realizar atividades diárias mais complexas, como lidar com finanças, planejar e executar uma reunião de família, controlar uso de medicamentos, fazer compras, pagar contas, etc. O declínio cognitivo é atribuído a uma causa neuronal subjacente, DA, vasculopatia cerebral, degeneração lobar frontotemporal, neuroinfecção, trauma craniencefálico, uso crônico de substâncias, etc. Embora o DSM-5 exija que haja apenas declínio em um dos domínios cognitivos (a CID-11 exige dois domínios), de modo geral, vários domínios cognitivos são afetados na demência. Além da memória, pode haver alterações da linguagem, que no início se manifestam como dificuldade em encontrar as palavras, mas posteriormente se revelam com o crescente uso de termos genéricos e inespecíficos (“aquela coisa” para se referir ao liquidificador ou “aquele homem” para se referir ao médico) e substituição de palavras específicas por termos dêiticos (“isso”, “ele”, “aquilo”, “lá”, “ali”). Com o evoluir da demência, ocorrem parafasias fonêmicas (usa bolo em vez de lobo, ou grápis em vez de lápis), parafasias verbais ou semânticas (falhas de nomeação no processo de seleção linguística, trocando, por exemplo, mãe por irmã, livro por caderno, copo por garrafa) e parafasias narrativas (erros de substituição de categorias narrativas, introduzindo em certa história elementos de uma outra, sem relação necessária). Tais alterações da linguagem podem se acentuar com a evolução da demência, o que pode levar ao surgimento de quadros graves de afasias, ecolalia ou perda total da linguagem."
Nosso gabarito é Letra D
Fonte: Sadock, Benjamin J. Compêndio de psiquiatria : ciência do comportamento e psiquiatria clínica [recurso eletrônico] / Benjamin J. Sadock, Virginia A. Sadock, Pedro Ruiz ; tradução: Marcelo de Abreu Almeida ... [et al.] ; revisão técnica: Gustavo Schestatsky... [et al.] – 11. ed. – Porto Alegre : Artmed, 2017.
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