Em um engenho sois imitadores de Cristo crucificado porque padeceis em um modo muito semelhante o que o mesmo Senhor padeceu na sua cruz e em toda a sua paixão. A sua cruz foi composta de dois madeiros, e a vossa em um engenho é de três. Também ali não faltaram as canas, porque duas vezes entraram na Paixão: uma vez servindo para o cetro de escárnio, e outra vez para a esponja em que lhe deram o fel. A Paixão de Cristo parte foi de noite sem dormir, parte foi de dia sem descansar, e tais são as vossas noites e os vossos dias. Cristo despido, e vós despidos; Cristo sem comer, e vós famintos; Cristo em tudo maltratado, e vós maltratados em tudo. Os ferros, as prisões, os açoites, as chagas, os nomes afrontosos, de tudo isto se compõe a vossa imitação, que, se for acompanhada de paciência, também terá merecimento de martírio.
VIEIRA, A. Sermões. Tomo XI. Porto: Lello & Irmão, 1951 (adaptado).
O trecho do sermão do Padre Antônio Vieira estabelece uma relação entre a Paixão de Cristo e
- A) a atividade dos comerciantes de açúcar nos portos brasileiros.
- B) a função dos mestres de açúcar durante a safra de cana.
- C) o sofrimento dos jesuítas na conversão dos ameríndios.
- D) o papel dos senhores na administração dos engenhos.
- E) o trabalho dos escravos na produção de açúcar.
Resposta:
A alternativa correta é letra E) o trabalho dos escravos na produção de açúcar.
Gabarito: Letra E
Sermões são textos em prosa que tinham objetivo de ensinar uma moral religiosa a quem tivesse contato com os documentos. Inspiravam-se no Sermão da Montanha proferido por Jesus Cristo.
O padre Antônio Vieira, importante jesuíta do século XVI e XVII, era um grande escritor e orador, deixando uma extensa obra sobre a qual se debruçam muitos pesquisadores.
Sabe-se que o jesuíta pregava seus sermões para todos e inclusive para os escravizados. Nesse sermão, o padre parece se dirigir diretamente aos escravizados fazendo uma analogia entre a Paixão de Cristo, acontecimento marcado pelo sofrimento e dor de Jesus, com o sofrimento cotidiano do trabalho dos escravos africanos na produção de açúcar.
Para comprovar nossa resposta há termos que evocam o cotidiano do mundo do trabalho das lavouras de cana, como, por exemplo:
“Em um engenho sois imitadores de Cristo crucificado (...) Também ali não faltaram as canas (...) Os ferros, as prisões, os açoites, as chagas, os nomes afrontosos, de tudo isto se compõe a vossa imitação”
Embora Vieira não estivesse preocupado com o fim da escravidão, desejando em seus textos que os proprietários de escravos tratassem bem seus servos, o jesuíta questionou as ideias correntes de que os escravizados eram coisas e objetos, possibilitando a humanização dos negros e assim advogava a salvação da alma para esses povos.
Por que as demais estão incorretas?
Letra A: a atividade dos comerciantes de açúcar nos portos brasileiros.
O sermão é dirigido diretamente aos escravizados como indivíduos que assim como Cristo sofreram o martírio da Paixão.
Letra B: a função dos mestres de açúcar durante a safra de cana.
Embora os mestres de açúcar fossem ocupações exercidas por escravizados, tratava-se de funções especializadas e diferenciadas em relação aos demais trabalhadores escravizados da produção açucareira.
Letra C: o sofrimento dos jesuítas na conversão dos ameríndios.
O sermão é direcionado para os escravizados comparando o seu sofrimento com o martírio de Cristo.
Letra D: o papel dos senhores na administração dos engenhos.
O sermão é direcionado para os escravizados comparando o seu sofrimento com o martírio de Cristo.
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