Concordo com o argumento de que traços totalitários são identificáveis nos discursos e práticas de Vargas, mas não se pode dizer que tenha havido, no período, “efetivação histórica do conceito em plano macro-institucional e societário”, como diz Roberto Romano.
[Maria Helena Rolim Capelato, Estado Novo: novas histórias.
Em Marcos Cezar de Freitas (org.). Historiografia brasileira em perspectiva]
Entre outros argumentos para não definir o Estado Novo como uma ordem totalitária, a historiadora aponta que
- A) não ocorreu o monopólio absoluto do Estado no plano físico, jurídico ou econômico, ainda que a repressão tenha sido intensa, e as liberdades, anuladas.
- B) a legislação trabalhista e sindical oferecia liberdade de organização aos trabalhadores das empresas privadas.
- C) a maior parte do ministério era formada por simpatizantes da ordem liberal, notadamente da experiência estadunidense.
- D) havia brechas jurídicas na Constituição de 1937 que garantiam representação política para parte considerável da população.
- E) as práticas políticas do governo autoritário respeitaram as particularidades regionais, especialmente no que se refere ao sistema educacional.
Resposta:
A alternativa correta é letra A) não ocorreu o monopólio absoluto do Estado no plano físico, jurídico ou econômico, ainda que a repressão tenha sido intensa, e as liberdades, anuladas.
Gabarito: ALTERNATIVA A
Concordo com o argumento de que traços totalitários são identificáveis nos discursos e práticas de Vargas, mas não se pode dizer que tenha havido, no período, “efetivação histórica do conceito em plano macro-institucional e societário”, como diz Roberto Romano.
[Maria Helena Rolim Capelato, Estado Novo: novas histórias. Em Marcos Cezar de Freitas (org.). Historiografia brasileira em perspectiva]
Entre outros argumentos para não definir o Estado Novo como uma ordem totalitária, a historiadora aponta que
- a) não ocorreu o monopólio absoluto do Estado no plano físico, jurídico ou econômico, ainda que a repressão tenha sido intensa, e as liberdades, anuladas.
A alternativa apenas repete, com outras palavras, o que a historiadora citada enuncia no trecho. O Estado Novo (1937-1945) foi, de fato, o período ditatorial por excelência de Vargas. Naquele momento, o país viveu sob regime de Estado único, com o fechamento do Congresso, a outorga de uma Constituição bastante centralizadora dos poderes e com a fragilização dos governos estaduais. Além disso, a repressão política, principalmente nas capitais, foi bastante expressiva, perseguindo opositores e debelando processos de resistência contra a escalada autoritária. No entanto, apesar da redução drástica das liberdades, isso não culminou num processo de grande sistematização do mando autoritário dentro das estruturas do Estado brasileiro, tampouco num controle profundo sobre a sociedade. O monopólio absoluto do Estado, ainda que fosse um desejo de Vargas, não foi concretizado, entre outros motivos, devido à fragilidade do próprio Estado brasileiro, que penetrava com dificuldade nos interiores. ALTERNATIVA CORRETA.
- b) a legislação trabalhista e sindical oferecia liberdade de organização aos trabalhadores das empresas privadas.
De fato, havia sido promulgada uma série de leis trabalhistas durante o Estado Novo. No entanto, a organização dos trabalhadores não era inteiramente livre, uma vez que se previa a mediação direta do Estado nos conflitos de classe e na limitação das ações dos sindicatos. Tratava-se de um sistema deliberadamente pensado para manter os trabalhadores organizados em sindicatos, mas sob importante controle e vigilância do Estado. O chamado "peleguismo sindical" no Brasil foi fortemente estruturado por iniciativa de Vargas para, disfarçadamente, reduzir as liberdades dos trabalhadores e modular as disputas sob os interesses do governo. Alternativa errada.
- c) a maior parte do ministério era formada por simpatizantes da ordem liberal, notadamente da experiência estadunidense.
Havia uma grande disputa dentro do governo Vargas em torno das vias autoritária e liberal. Ainda que cultivasse, sim, um importante grupo de agentes e de intelectuais simpáticos à experiência dos Estados Unidos e comprometidos com o liberalismo; o governo Vargas também tinha alas francamente germanófilas e simpáticas à expansão do Estado autoritário. Não por um acaso, enquanto foi possível, o Estado Novo manteve externamente a chamada "equidistância pragmática" entre Estados Unidos e Alemanha nazista, fazendo acenos aos dois extremos do espectro político. Não se pode, de maneira alguma, dar como óbvio o alinhamento brasileiro aos Estados Unidos, tampouco se desprezar os importantes gestos de simpatia e amizade feitos em direção ao nazi-fascismo europeu. Alternativa errada.
- d) havia brechas jurídicas na Constituição de 1937 que garantiam representação política para parte considerável da população.
A representação política estava praticamente interditada durante o Estado Novo. Sem eleições e com o Congresso Nacional fechado, os mecanismos de representação eram extremamente limitados e praticamente não havia liberdade política no país. A Constituição de 1937 consagrou o regime de partido único no Brasil, banindo, na prática, as oposições de oposição e forçando a redução da representação às entidades de classe, que, como apontado acima, eram muito controladas pelo governo central. Alternativa errada.
- e) as práticas políticas do governo autoritário respeitaram as particularidades regionais, especialmente no que se refere ao sistema educacional.
Muito pelo contrário, o Estado Novo ficou conhecido pela iniciativa de federalização de parte significativa das políticas públicas, reduzindo drasticamente a mobilidade dos governos estaduais - os quais, aliás, também passaram por intervenção federal. As particularidades regionais foram antes interpretadas como entraves ao projeto central de modernização geral do Estado e do país, entendendo-se como necessária a uniformização geral dos principais aspectos da vida brasileira a partir da capital federal. O sistema educacional, inclusive, passaria pelas reformas de Gustavo Capanema, que centralizaria e unificaria a instrução pública de modo a uniformizar um sistema pensado federalmente, e não mais a partir das iniciativas dos governos estaduais. Alternativa errada.
Note o estudante que nenhuma das alternativas erradas estabelecia o menor diálogo com o trecho citado no enunciado. Isto deveria, no momento da prova, servir como um alerta para que se prestasse mais atenção e se fizesse um esforço mais adequado de interpretação de texto. Com uma observação adequada dessas nuances, seria possível acertar a questão sem gastar um tempo excessivo. Sem mais, está correta a ALTERNATIVA A.
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