Fugindo à luta de classes, a nossa organização sindical tem sido um instrumento de harmonia e de cooperação entre o capital e o trabalho. Não se limitou a um sindicalismo puramente “operário”, que conduziria certamente a luta contra o “patrão”, como aconteceu com outros povos.
FALCÃO, W. Cartas sindicais. In: Boletim do Ministério do Trabalho, Indústria e Comércio.
Rio de Janeiro, 10 (85), set. 1941 (adaptado).
Nesse documento oficial, à época do Estado Novo (1937- 1945), é apresentada uma concepção de organização sindical que
- A) elimina os conflitos no ambiente das fábricas.
- B) limita os direitos associativos do segmento patronal.
- C) orienta a busca do consenso entre trabalhadores e patrões.
- D) proíbe o registro de estrangeiros nas entidades profissionais do país.
- E) desobriga o Estado quanto aos direitos e deveres da classe trabalhadora.
Resposta:
A alternativa correta é letra C) orienta a busca do consenso entre trabalhadores e patrões.
Gabarito: Letra C
Ao afirmar a busca por fugir à luta de classes e ser um instrumento de harmonia e de cooperação entre o capital e o trabalho, a organização sindical citada no trecho demonstra estar orientada numa noção de consenso típica desse período.
O Estado criado a partir da Revolução de 1930 procurava passar a imagem de um Estado racional e racionalizado, composto por um corpo técnico especializado, competente, objetivo, neutro e capaz de intervir com firmeza em todas as esferas da sociedade de forma a evitar conflitos. Sua formulação tinha como ponto de partida a teoria corporativista, que demarcava como função do Estado a resolução, ou mesmo a eliminação, de conflitos, vistos como fruto da desorganização da vida econômica e da ausência de uma moral profissional baseada em regras jurídicas.
É nesse contexto que se dá a criação de uma legislação trabalhista e social como uma estratégia de cooptação de grupos políticos oposicionistas e de criação de uma atmosfera de conciliação nacional entre as classes sociais. Que, conforme aparece no trecho citado, foi absorvida pelas organizações sindicais oficializadas.
Isso porque, para evitar conflitos entre uma classe trabalhadora e uma patronal, o Estado buscou neutralizar o crescimento da pressão dessa classe trabalhadora através da “antecipação” do Estado às reivindicações, mas além disso, procurou também absorver e controlar as organizações dessa mesma classe, ou seja, as organizações sindicais.
Dessa forma, foi criada uma legislação trabalhista com aprovação de reivindicações antigas dos trabalhadores: limitação da jornada de trabalho, regulamentação do trabalho feminino e infantil, pagamento de horas extras, férias, pensões e aposentadorias, entre diversas outras. Porém, em seu bojo havia uma armadilha, para ter acesso a muitas dessas leis, o trabalhador tinha que estar filiado a um sindicado registrado e reconhecido oficialmente pelo Ministério do Trabalho, como o que aparece no texto da questão.
Na prática, isso significou, um esvaziamento político dos sindicatos, já que, de acordo com a Lei de Sindicalização, de março de 1931, que estabelecia a existência de apenas um sindicato de cada categoria profissional em cada município, os sindicatos que fossem registrados conforme determinava a lei, passavam a ser considerados “órgãos consultivos e técnicos” no estudo e solução, pelo Governo Federal, dos problemas relacionados aos seus interesses de classe”.
Assim, o discurso dessa organização sindical, presente no trecho, assumiu a lógica e o discurso de consenso empreendida pelo próprio Estado criado à época, em vista do maior controle sobre as entidades sindicais durante esse período.
Por que as demais estão incorretas?
A questão quer saber qual é a concepção de organização sindical exposta no trecho de texto apresentado, ou seja, qual a ideologia, por trás do discurso. As demais alternativas trazem ações que não são citadas no texto e não são concepções. Além disso...
Letra A: elimina os conflitos no ambiente das fábricas.
A concepção de organização sindical apresentada pelo texto não elimina os conflitos presente no ambiente das fábricas, apenas buscam resolve-los pela via da conciliação e do consenso.
Letra B: limita os direitos associativos do segmento patronal.
A concepção de organização sindical apresentada pelo texto não limita os direitos associativos do segmento patronal, visto que, é uma concepção conciliatória e que se impôs mais aos trabalhadores (através da concessão de leis trabalhistas e do controle dos sindicatos) do que aos patrões.
Letra D: proíbe o registro de estrangeiros nas entidades profissionais do país.
Como uma concepção conciliadora, não poderia proibir o registro de estrangeiros nas entidades profissionais do país. Perceba que, em nenhum momento, o texto cita ou deixa subentendido essa espécie de proibição.
Letra E: desobriga o Estado quanto aos direitos e deveres da classe trabalhadora.
Como já vimos, o Estado nesse período tem papel preponderante na criação do consenso entre a classe trabalhadora e a patronal. Para tal fim, a criação de direitos (legislação trabalhista) e deveres (carteira de trabalho, filiação em sindicatos oficiais) para a classe trabalhadora durante esse período foi de suma importância para a afirmação de uma concepção de consenso e conciliação.
Referências:
FALCÃO, W. Cartas sindicais. In: Boletim do Ministério do Trabalho, Indústria e Comércio. Rio de Janeiro, 10 (85), set. 1941.
MUNAKATA, Kazumi. A legislação trabalhista no Brasil. São Paulo, Brasiliense 1985.
VAINFAS, Ronaldo et ali. História: o mundo por um fio: do século XX ao XXI, volume 3. São Paulo: Saraiva, 2010.
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