Uma das consequências do chamado milagre brasileiro foi a “reconcentração” de renda no período de 1960-70 (especialmente entre 1967-72, quando o crescimento se tornou mais acentuado). Essa concentração de renda derivou da política de compressão salarial do período, que derrubou o valor do salário-mínimo e, consequentemente, o poder aquisitivo dos grupos de mais baixa renda. Durante esse período, a agricultura do país aumentou a utilização de fertilizantes e defensivos, aumentou as exportações e a dependência de crédito rural, mas não trouxe melhoras significativas nos índices de renda para a maior parte de trabalhadores e trabalhadoras do campo. Esse fenômeno já foi chamado de modernização conservadora ou modernização sem mudança. Sobre esse fenômeno, analise as afirmativas a seguir.
I. A dificuldade do capital em transformar a agricultura do país deveu-se, dentre outros fatores, ao papel determinante que a propriedade de terra assumia por vezes como mera reserva de valor.
II. A persistência e recriação da pequena produção, por meio de pequenas e pequenos proprietárias (os), posseiras (os), arrendatárias (os), parceiras (os), dentre outras categorias, mostrava como a mobilização das pessoas que não eram assimiladas no processo de modernização do campo tornava possível a sua manutenção econômica e social.
III. A exploração da mão de obra familiar no período diminuiu.
IV. Os instrumentos de política agrícola conseguiram superar o privilégio de regiões e cultivos como a cana-de-açúcar, algodão e soja.
Assinale a alternativa correta.
- A) Apenas a afirmativa I está correta
- B) Apenas a afirmativa II está correta
- C) As afirmativas II e IV estão corretas
- D) As afirmativas I e II estão corretas
- E) As afirmativas I, II, III e IV estão corretas
Resposta:
A alternativa correta é letra D) As afirmativas I e II estão corretas
Gabarito: Letra D
As afirmativas I e II estão corretas
Vejamos as afirmativas:
I. A dificuldade do capital em transformar a agricultura do país deveu-se, dentre outros fatores, ao papel determinante que a propriedade de terra assumia por vezes como mera reserva de valor. (Correto)
A dificuldade de se estabelecer uma modernização que não fosse conservadora, ou seja, fruto de um pacto entre a burguesia e os proprietários de terra com manutenção das velhas estruturas fundiárias, estava justamente na reserva de valor que representava a propriedade de terras, o que impediu a realização da reforma agrária e de uma modernização baseada no fracionamento da estrutura fundiária nacional.
Assim, o aumento da concentração de terras, por conta da sua utilização como reserva de valor ou especulação imobiliária, não necessariamente associada a sua utilização como meio de produção, foi um dos fatores a dificultar o avanço do capital na transformação da agricultura brasileira.
II. A persistência e recriação da pequena produção, por meio de pequenas e pequenos proprietárias (os), posseiras (os), arrendatárias (os), parceiras (os), dentre outras categorias, mostrava como a mobilização das pessoas que não eram assimiladas no processo de modernização do campo tornava possível a sua manutenção econômica e social. (Correto)
A modernização conservadora da agricultura brasileira retirava da terra os proprietários rurais que não conseguiam modernizar-se, tornando-os “mão-de-obra” disponível aos mercados de trabalho capitalista. Assim a modernização conservadora propiciou terras e força de trabalho ao mercado capitalista ligado ao campo ou às cidades. Ainda assim, existiram formações de setores que contribuíram para a constituição de uma agricultura familiar capitalista.
Segundo Bernardo Sorj, o processo de modernização da agricultura nacional constituiu três setores característicos:
- Um setor de empresas fundadas nas relações de produção capitalistas e tecnologia moderna;
- Um setor de empresas familiares altamente capitalizadas, fundadas no trabalho familiar com pouca ou nenhuma utilização de trabalho assalariado;
- Um setor de produção tradicional baseado na pequena propriedade familiar ou arrendamento e parcerias tradicionais e na exploração pecuária extensiva.
Dessa forma, as pessoas que não eram assimiladas no processo de modernização conservadora do campo, buscaram sua manutenção econômica e social na recriação da pequena produção da maneira que lhes era possível.
III. A exploração da mão de obra familiar no período diminuiu. (Incorreto)
Como vimos, o trabalho familiar no campo continuou existindo mesmo que em moldes reformulados, visto que entre os setores formados no processo de modernização da agricultura nacional podemos encontrar:
- Um setor de empresas familiares altamente capitalizadas, fundadas no trabalho familiar com pouca ou nenhuma utilização de trabalho assalariado;
- Um setor de produção tradicional baseado na pequena propriedade familiar ou arrendamento e parcerias tradicionais e na exploração pecuária extensiva.
Além disso, a exploração da mão de obra no campo aumentou nesse período, visto que a expansão da grande propriedade com a mecanização e a utilização de agroquímicos diminuiu a necessidade de mão de obra permanente, atingindo os trabalhadores volantes (bóias-frias), que vendo diminuir a sua oferta de trabalho acabaram se sujeitando a duros turnos no campo por diárias cada vez menores.
IV. Os instrumentos de política agrícola conseguiram superar o privilégio de regiões e cultivos como a cana-de-açúcar, algodão e soja. (Incorreto)
Com o desenvolvimento da agroindústria, tradicionais produtos de exportação como o café, o cacau, o algodão, o fumo, tiveram desvantagens perante novas culturas voltadas à indústria e à exportação, como foi o caso da soja que passou a ser largamente produzida com a modernização agrícola. Logo, a soja não faz parte dos tradicionais produtos “privilegiados” no mercado externo, pois passou a ser produzida em larga escala com destino à exportação durante o período da modernização conservadora.
Referências:
BALSAN, Rosane. Impactos decorrentes da modernização da agricultura brasileira. CAMPO-TERRITÓRIO: revista de geografia agrária, v.1, n.2, ago. 2006.
PIRES, Murilo José de Souza; RAMOS, Pedro. O termo modernização conservadora: sua origem e utilização no Brasil. Revista Econômica do Nordeste, vl. 40, n.3, jul-set, 2009.
VAINFAS, Ronaldo et ali. História: o mundo por um fio: do século XX ao XXI, volume 3. São Paulo: Saraiva, 2010.
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