Considere o texto abaixo.
Os órgãos integram a estrutura do Estado e das demais pessoas jurídicas como partes desses corpos vivos, dotados de vontade e capazes de exercer direitos e contrair obrigações para a consecução de seus fins institucionais. Por isso mesmo, os órgãos não têm personalidade jurídica nem vontade própria, que são atributos do corpo e não das partes, mas na área de suas atribuições e nos limites de sua competência funcional expressam a vontade da entidade a que pertencem e a vinculam por seus atos, manifestados através de seus agentes (pessoas físicas). Como partes das entidades que integram, os órgãos são meros instrumentos de ação dessas pessoas jurídicas, preordenados ao desempenho das funções que lhes forem atribuídas pelas normas de sua constituição e funcionamento. Para a eficiente realização de suas funções, cada órgão é investido de determinada competência, redistribuída entre seus cargos, com a correspondente parcela de poder necessária ao exercício funcional de seus agentes.
Embora despersonalizados, os órgãos mantêm relações funcionais entre si e com terceiros, das quais resultam efeitos jurídicos internos e externos, na forma legal ou regulamentar. E, a despeito de não terem personalidade jurídica, os órgãos podem ter prerrogativas funcionais próprias que, quando infringidas por outro órgão, admitem defesa até mesmo por mandado de segurança.
(MEIRELLES, Hely Lopes. Direito Administrativo Brasileiro. 15.ed., São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 1990, p. 59)
Com base no texto transcrito e no regime jurídico dos órgãos administrativos, é correto afirmar:
- A) O texto transcrito aborda a teoria do mandato, por meio da qual aos agentes públicos seriam delegados poderes para que agissem em nome e no interesse do Estado.
- B) Os órgãos públicos são centros de competências instituídos para o desempenho de funções estatais, através de seus agentes, cuja atuação é imputada à pessoa jurídica a que pertencem.
- C) O texto transcrito traz uma concepção de órgão que contraria a formulação da teoria do órgão, atribuída a Otto Gierke, que criou uma doutrina para justificar como se dá a manifestação da vontade do Estado por meio de seus órgãos, por meio da noção de que os agentes públicos, ao agir, expressam a vontade do Estado.
- D) Por serem despersonalizados, os órgãos públicos não mantêm relações funcionais com terceiros, dos quais resultam efeitos jurídicos externos.
- E) No texto, é apresentada a teoria da representação, pela qual a vontade dos agentes exprimiria a vontade do Estado, como ocorre na tutela ou na curatela.
Resposta:
A alternativa correta é letra B) Os órgãos públicos são centros de competências instituídos para o desempenho de funções estatais, através de seus agentes, cuja atuação é imputada à pessoa jurídica a que pertencem.
Vejamos cada uma das alternativas propostas, à procura da correta:
a) Errado:
Na realidade, no texto transcrito no enunciado da questão, Hely Lopes Meirelles aborda sustenta a consagrada teoria do órgão, amplamente aceita, baseada na ideia de imputação, rechaçando, ademais, as teorias da representação e do mandato, o que fica bem claro pelo seguinte trecho da mesma obra doutrinária:
"Não há entre a entidade e seus órgãos relação de representação ou de mandato, mas sim de imputação, porque a atividade dos órgãos identifica-se e confunde-se com a da pessoa jurídica. Daí por que os atos dos órgãos são havidos como da própria entidade que eles compõem."
(MEIRELLES, Hely Lopes. Direito Administrativo Brasileiro. 27ª ed. São Paulo: Malheiros, 2002)
Logo, incorreta esta opção.
b) Certo:
O conceito de órgão público apresentado nesta alternativa é exatamente aquele proposto pelo citado doutrinador, bem assim agasalhado pela doutrina brasileira, como se depreende do trecho abaixo:
"Órgãos públicos - São centros de competências instituídos para o desempenho de funções estatais, através de seus agentes, cuja atuação é imputada à pessoa jurídica a que pertencem." (idem).
c) Errado:
Pelo contrário, o texto do enunciado da questão encampa, justamente, a teoria do órgão, longe de contrariá-la.
d) Errado:
Novamente, trata-se de assertiva em rota de colisão com a obra doutrinária referida no enunciado, como se vê do trecho abaixo colacionado:
"Embora despersonalizados, os órgãos mantêm relações funcionais entre si e com terceiros, das quais resultam efeitos jurídicos internos e externos, na forma legal ou regulamentar." (ibidem)
e) Errado:
Conforme dito anteriormente, a teoria da representação não prevaleceu, tendo sido superada pela teoria do órgão, esta sim abraçada no texto do enunciado, da lavra de Hely Lopes Meirelles, e, de resto, também acolhida por nossa doutrina.
Gabarito: B
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