Dadas as assertivas abaixo, assinalar a alternativa correta.
I. A denominada coisa julgada administrativa é apenas preclusão dos efeitos internos, irretratabilidade do ato perante a própria Administração.
II. Função jurisdicional é aquela em que o Estado, diretamente ou mediante delegação, resolve em definitivo os conflitos entre particulares.
III. O princípio da primazia do interesse público faz pressupor uma coincidência necessária entre interesse público e interesse das pessoas de Direito Público.
IV. Em razão de que adotado no Brasil o sistema anglo-americano, há monismo jurisdicional, cabendo a prestação da jurisdição exclusivamente ao Poder Judiciário.
- A) Está correta apenas a assertiva I.
- B) Estão corretas apenas as assertivas I e IV.
- C) Estão corretas apenas as assertivas II e III.
- D) Estão corretas apenas as assertivas I, II e IV.
Resposta:
A alternativa correta é letra B) Estão corretas apenas as assertivas I e IV.
Julguemos cada afirmativa da Banca:
I. A denominada coisa julgada administrativa é apenas preclusão dos efeitos internos, irretratabilidade do ato perante a própria Administração.
CERTO
Realmente, a ideia de coisa julgada administrativa consiste apenas na impossibilidade de a decisão ser alterada dentro da própria Administração. Isto não impede, contudo, que a matéria seja submetida a exame pelo Poder Judiciário, à luz do princípio da inafastabilidade do controle jurisdicional, bastando, para tanto, que haja lesão ou ameaça a direitos e que ocorra a devida provocação pelo interessado.
II. Função jurisdicional é aquela em que o Estado, diretamente ou mediante delegação, resolve em definitivo os conflitos entre particulares.
ERRADO
Completamente descabido sustentar a possibilidade de delegação da função jurisdicional, porquanto se cuida de atividade típica de Estado. A fim de oferecer ao menos uma base legal para tanto, pode-se citar o teor do art. 4º, III, que explicita a natureza indelegável de tal função. Confira-se:
"Art. 4º Na contratação de parceria público-privada serão observadas as seguintes diretrizes:
(...)
III – indelegabilidade das funções de regulação, jurisdicional, do exercício do poder de polícia e de outras atividades exclusivas do Estado;"
Assim, está errada esta segunda proposição.
III. O princípio da primazia do interesse público faz pressupor uma coincidência necessária entre interesse público e interesse das pessoas de Direito Público.
ERRADO
O interesse público, em verdade, é sinônimo de interesse público primário, que vem a ser aquele pertencente, de fato, à toda a coletividade, ao corpo social. Por seu turno, o interesse das pessoas de direito público é tido como um interesse público meramente secundário, relacionado, mais diretamente, a interesses de cunho patrimonial de tais pessoas. Não apenas inexiste coincidência necessária entre os interesses públicos primário e secundário como, inclusive, é possível que, em dadas circunstâncias, contraponham-se um ao outro.
A distinção entre os interesses públicos primário e secundário fica clara pela seguinte lição doutrinária, oferecida por Celso Antônio Bandeira de Mello:
"Interesse público ou primário, repita-se, é o pertinente à sociedade como um todo, e só ele pode ser validamente objetivado, pois este é o interesse que a lei consagra e entrega à compita do Estado como representante do corpo social. Interesse secundário é aquele que atine tão só ao aparelho estatal enquanto entidade personalizada, e que por isso mesmo pode lhe ser referido e nele encarnar-se pelo simples fato de ser pessoa, mas que só pode ser validamente perseguido pelo Estado quando coincidente com o interesse público primário."
IV. Em razão de que adotado no Brasil o sistema anglo-americano, há monismo jurisdicional, cabendo a prestação da jurisdição exclusivamente ao Poder Judiciário.
CERTO
De fato, nosso ordenamento abraçou o sistema da unidade/unidade de jurisdição, de origem inglesa/americana, caracterizada pelo fato de que somente o Poder Judiciário é competente para decidir, com definitividade (formação de coisa julgada material), as controvérsias estabelecidas nas relações sociais, mesmo que envolvam entes pertencentes à Administração Pública.
Neste sentido, a doutrina de Vicente Paulo e Marcelo Alexandrino:
"O Brasil adota o denominado 'sistema inglês', ou 'sistema de unicidade de jurisdição'. Em poucas palavras, significa isso que somente o Poder Judiciário tem jurisdição, isto é, somente ele pode dizer, em caráter definitivo, o direito aplicável aos casos concretos litigiosos submetidos a sua apreciação."
Não se desconhece, é importante ressaltar, a existência de exceções, deveras pontuais, quais sejam, os julgamentos, pelo Legislativo, de certas autoridades, em razão de crimes de responsabilidade. Nada obstante, me parece que a Banca quis se referir tão somente à regra geral, que consiste realmente no exercício de jurisdição apenas pelo Judiciário.
Em suma, pelos termos em que foi redigida a proposição, afigura-se ser necessário raciocinar à luz da regra geral.
Logo, acertada esta proposição, de modo que estão corretas apenas as assertivas I e IV.
Gabarito: Letra B
Referências:
BANDEIRA DE MELLO, Celso Antônio. Curso de Direito Administrativo. 30ª ed. São Paulo: Malheiros, 2012, p. 102.
PAULO, Vicente. ALEXANDRINO, Marcelo. Direito Constitucional Descomplicado. 12ª ed. São Paulo: Método, 2014, p. 672.
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