Com relação à aplicabilidade dos meios consensuais de solução de conflitos que envolvam o poder público, é correto afirmar que:
- A) eles não se aplicam à administração pública. A inafastabilidade da jurisdição decorrente da soberania impede a administração de negociar e firmar acordos com particulares.
- B) o interesse público não pode ser objeto de transação pela administração. Nesse sentido, o campo de atuação desses meios consensuais no direito administrativo é muito restrito pela indisponibilidade do interesse público.
- C) a supremacia do interesse público sobre o particular não legitima a realização de mediação e/ou arbitragem em conflitos em que a administração pública é parte.
- D) Lei n. 13.140 de 26.06.2015 - Lei de Mediação - permite a autocomposição de conflitos como meio de solução de conflitos que envolvam a administração pública, incluindo no seu objeto os direitos disponíveis e os indisponíveis que admitam transação.
- E) é cabível a utilização da arbitragem em conflitos decorrentes de contratos de concessões e permissões de serviços públicos, cujo objeto envolvam atos de gestão e de império da administração.
Resposta:
A alternativa correta é letra D) Lei n. 13.140 de 26.06.2015 - Lei de Mediação - permite a autocomposição de conflitos como meio de solução de conflitos que envolvam a administração pública, incluindo no seu objeto os direitos disponíveis e os indisponíveis que admitam transação.
Gabarito: Letra D.
A questão trata da possibilidade ou não de a Administração Pública usar meios alternativos à Jurisdição para solucionar conflitos e de usar a transação como forma de extinguir conflitos já levados ao Judiciário.
Em linhas gerais, diante de um litígio, pode ser demandada a justiça (jurisdição), pode ser demandado um árbitro (arbitragem, espécie de justiça privada), pode-se usar da autotutela (uso da força, em regra proibido, mas válido, p.ex., no desforço imediato, na legítima defesa etc.), da conciliação (terceiro como intermediário das partes) ou da mediação (terceiro como facilitador de acordo entre as partes).
Quanto à solução de litígios em que a Administração Pública é parte, no CPC, há previsão expressa a respeito da possibilidade de os entes públicos valerem-se de meios alternativos à jurisdição para solucionarem ou evitarem conflitos:
Art. 174. A União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios criarão câmaras de mediação e conciliação, com atribuições relacionadas à solução consensual de conflitos no âmbito administrativo, tais como:
I - dirimir conflitos envolvendo órgãos e entidades da administração pública;
II - avaliar a admissibilidade dos pedidos de resolução de conflitos, por meio de conciliação, no âmbito da administração pública;
III - promover, quando couber, a celebração de termo de ajustamento de conduta.
Na Lei de Arbitragem (Lei 9.307/1996), há previsão expressa de que a administração pode submeter à Arbitragem questões relativas a direitos patrimoniais disponíveis:
Art. 1º As pessoas capazes de contratar poderão valer-se da arbitragem para dirimir litígios relativos
a direitos patrimoniais disponíveis.
§ 1º A administração pública direta e indireta poderá utilizar-se da arbitragem para dirimir
conflitos relativos a direitos patrimoniais disponíveis.
§ 2º autoridade ou o órgão competente da administração pública direta para a celebração de
convenção de arbitragem é a mesma para a realização de acordos ou transações.
Por sua vez, a Lei 13.140/2015, que cuida da mediação, logo no art. 1o, inclui as controvérsias que envolvam órgãos e entidades da Administração Pública: Esta Lei dispõe sobre a mediação como meio de solução de controvérsias entre particulares e sobre a autocomposição de conflitos no âmbito da administração pública.
Nos artigos 35 e seguintes, a Lei 13.140/2015 trata do uso da transação e das alternativas ao judiciário, pelo ente público, para solução de controvérsias. Destaque-se o seguinte:
Art. 35. As controvérsias jurídicas que envolvam a administração pública federal direta, suas autarquias e fundações poderão ser objeto de transação por adesão, com fundamento em:
I – autorização do Advogado-Geral da União, com base na jurisprudência pacífica do Supremo Tribunal Federal ou de tribunais superiores; ou
II – parecer do Advogado-Geral da União, aprovado pelo Presidente da República....
Art. 36. No caso de conflitos que envolvam controvérsia jurídica entre órgãos ou entidades de direito público que integram a administração pública federal, a Advocacia-Geral da União deverá realizar composição extrajudicial do conflito, observados os procedimentos previstos em ato do Advogado- Geral da União.
Por todo o exposto, o que foi afirmado nas alternativas A, B e C, nas quais se diz, peremptoriamente, que é proibido ao poder público usar meios consensuais, transacionar ou mesmo fazer uso de mediação ou arbitragem, contraria expressamente o que está previsto na nossa legislação.
Por sua vez, a alternativa D está correta e conjuga a inteligência dos dispositivos citados com a do art. 3º da Lei de Mediação:
Pode ser objeto de mediação o conflito que verse sobre direitos disponíveis ou sobre direitos indisponíveis que admitam transação.
Há decisão do STF que também legitima a afirmação externada na letra D:
RE 253.885-MG: "Poder Público. Transação. Validade. Em regra, os bens e o interesse público são indisponíveis, porque pertencem à coletividade. É, por isso, o Administrador, mero gestor da coisa pública, não tem disponibilidade sobre os interesses confiados à sua guarda e realização. Todavia, há casos em que o princípio da indisponibilidade do interesse público deve ser atenuado, mormente quando se tem em vista que a solução adotada pela Administração é a que melhor atenderá à ultimação deste interesse”. [...]
E onde está o erro da letra E? De fato, a possibilidade de solução amigável e do uso de mecanismos privados para a solução de conflitos, aí incluída a arbitragem, deverá constar nos contratos de concessão e permissão de serviços públicos, a teor do que que dizem os artigos 23, XV e 23-A, da Lei 8.987/1995:
Art. 23. São cláusulas essenciais do contrato de concessão as relativas: [...]
(...)
XV - ao foro e ao modo amigável de solução das divergências contratuais.
Art. 23-A. O contrato de concessão poderá prever o emprego de mecanismos privados para resolução de disputas decorrentes ou relacionadas ao contrato, inclusive a arbitragem, a ser realizada no Brasil e em língua portuguesa, nos termos da Lei no 9.307, de 23 de setembro de 1996.
Então, onde está o erro da opção E? No fato de o examinador incluir os atos de império, os quais se caracterizam pela indisponibilidade e pela supremacia do interesse públicos sobre o interesse privado.
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