No processo de modernização da Administração Pública brasileira, marcado pela adoção de uma concepção neoliberal de política econômica voltada à redução do aparato estatal, a crescente transferência à iniciativa privada de atividades até então exercidas pelo Estado fez surgir a necessidade de fiscalização e controle das pessoas privadas que assumiam a incumbência da prestação de serviços públicos, em regra sob a forma de concessão ou permissão. Com inspiração no modelo norte-americano de regulação econômica e social, atribuiu-se às chamadas agências reguladoras o papel precípuo de controle da prestação de serviços públicos e do exercício de atividades econômicas, de modo a adequar a atuação desses atores privados aos fins colimados pela Administração, notadamente a proteção do consumidor.
Dentre as peculiaridades das agências reguladoras, a doutrina especializada costuma destacar a natureza jurídica de:
- A) autarquia sob regime especial e a gestão por dirigentes estáveis exercentes de mandatos fixos que asseguram certa independência em relação ao governo, além do poder normativo, consistente na edição de normas técnicas que ostentam status legal;
- B) empresa pública sob regime especial e a gestão por dirigentes titulares de cargos efetivos que asseguram certa independência em relação ao governo, além do poder normativo, consistente na competência para regulamentar as leis que disciplinam o respectivo setor;
- C) autarquia sob regime especial e a gestão por dirigentes titulares de cargos efetivos que asseguram certa independência em relação ao governo, além do poder normativo, consistente na competência para regulamentar as leis que disciplinam o respectivo setor;
- D) autarquia sob regime especial e a gestão por dirigentes estáveis exercentes de mandatos fixos que asseguram certa independência em relação ao governo, além do poder normativo, consistente na edição de normas técnicas capazes de integrar a legislação aplicável ao setor, sem criar ou extinguir direitos e obrigações;
- E) órgão público sob regime especial e a gestão por dirigentes exercentes de funções de confiança que garantem o alinhamento às diretrizes do Poder Executivo, além do poder normativo, consistente na edição de normas técnicas capazes de integrar a legislação aplicável ao setor, sem criar ou extinguir direitos e obrigações.
Resposta:
A alternativa correta é letra D) autarquia sob regime especial e a gestão por dirigentes estáveis exercentes de mandatos fixos que asseguram certa independência em relação ao governo, além do poder normativo, consistente na edição de normas técnicas capazes de integrar a legislação aplicável ao setor, sem criar ou extinguir direitos e obrigações;
Gabarito: letra D.
Inicialmente, destaca-se que cada agência reguladora é disciplinada por uma lei específica. Assim, não é possível, a princípio, falar em um regime jurídico único aplicado a toda e qualquer agência reguladora. Contudo, a partir da análise dos diversos diplomas normativos pertinentes ao assunto, a doutrina tem entendido que há certas características comuns à maioria das agências reguladoras, quais sejam:
- poder normativo;
- autonomia decisória;
- autonomia econômico-financeira; e
- independência administrativa.
O conjunto dessas características compõe o que se convencionou chamar de regime jurídico especial das agências reguladoras.
Importa ressaltar, quanto ao poder normativo, que ele encontra limites na lei e com ela não se confunde. O exercício do poder normativo das agências reguladoras representa a manifestação do exercício das suas competências, que, vale frisar, são de natureza exclusivamente administrativa, uma vez que a função legislativa típica, em razão do princípio constitucional da separação dos Poderes, é atribuição exclusiva do Poder Legislativo.
Ainda, pode-se definir as agências reguladoras como pessoas jurídicas de direito público, com natureza jurídica de autarquias de regime especial, cuja função é regulamentar, controlar e fiscalizar determinado setor econômico ou atividades que constituem objeto de delegação de serviço público ou de concessão para exploração de bem público. (ALEXANDRE, Ricardo; DEUS, João de. Direito Administrativo Esquematizado.1ª ed. São Paulo: Método, 2015. P. 154/156)
Partindo-se dessas premissas, julguemos as alternativas:
a) autarquia sob regime especial e a gestão por dirigentes estáveis exercentes de mandatos fixos que asseguram certa independência em relação ao governo, além do poder normativo, consistente na edição de normas técnicas que ostentam status legal; - errada.
A legislação confere autonomia às agências reguladoras para editar atos administrativos normativos, dotados de conteúdo técnico e respeitados os parâmetros (standards) legais, no âmbito do setor regulado. (OLIVEIRA, Rafael Carvalho Rezende de. Curso de Direito Administrativo. 9ª ed. rev. e atual. Rio de Janeiro: Forense; São Paulo: Método, 2021. P. 213)
Observa-se que as normas técnicas não ostentam status legal, razão pela qual está incorreta a alternativa.
b) empresa pública sob regime especial e a gestão por dirigentes titulares de cargos efetivos que asseguram certa independência em relação ao governo, além do poder normativo, consistente na competência para regulamentar as leis que disciplinam o respectivo setor; - errada.
A natureza jurídica das agências reguladoras é de de autarquias de regime especial.
c) autarquia sob regime especial e a gestão por dirigentes titulares de cargos efetivos que asseguram certa independência em relação ao governo, além do poder normativo, consistente na competência para regulamentar as leis que disciplinam o respectivo setor; - errada.
Conforme observa Rafael Oliveira, a autonomia administrativa das agências reguladoras pode ser demonstrada pela estabilidade dos seus dirigentes que são brasileiros, de reputação ilibada, formação acadêmica compatível com o cargo e elevado conceito no campo do setor regulado, nomeados pelo Presidente da República, após aprovação do Senado (art. 5º da Lei nº 9.986/00). Trata-se de estabilidade diferenciada, caracterizada pelo exercício de mandato a termo, não coincidente com o mandato do agente político, bem como pela impossibilidade de exoneração ad nutum. (OLIVEIRA, Rafael Carvalho Rezende de. Curso de Direito Administrativo. 9ª ed. rev. e atual. Rio de Janeiro: Forense; São Paulo: Método, 2021. P. 217)
Nesse contexto, tem-se que a gestão das agências reguladoras é realizada por meio de exercentes de mandato e não por titulares de cargos efetivos.
d) autarquia sob regime especial e a gestão por dirigentes estáveis exercentes de mandatos fixos que asseguram certa independência em relação ao governo, além do poder normativo, consistente na edição de normas técnicas capazes de integrar a legislação aplicável ao setor, sem criar ou extinguir direitos e obrigações; - certa.
Efetivamente, as agências reguladoras:
- têm natureza jurídica de autarquia sob regime especial;
- sua gestão é realizada por dirigentes estáveis exercentes de mandatos fixos;
- exercem poder normativo, o qual encontra limites na lei e representa a manifestação do exercício das suas competências, que são de natureza exclusivamente administrativa, uma vez que a função legislativa típica, em razão do princípio constitucional da separação dos Poderes, é atribuição exclusiva do Poder Legislativo. Logo, a edição de normas técnicas decorrentes do poder normativo não podem criar ou extinguir direitos e obrigações.
Correta a alternativa, portanto, devendo ser assinalada.
e) órgão público sob regime especial e a gestão por dirigentes exercentes de funções de confiança que garantem o alinhamento às diretrizes do Poder Executivo, além do poder normativo, consistente na edição de normas técnicas capazes de integrar a legislação aplicável ao setor, sem criar ou extinguir direitos e obrigações. - errada.
A natureza jurídica das agências reguladoras é de de autarquias de regime especial.
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