Uma sociedade de economia mista prestadora de serviço público integrante da Administração indireta de determinado ente federado
- A) submete-se a regime jurídico de direito público, transitoriamente, durante o tempo em que exercer aquele múnus público típico da Administração direta.
- B) é dotada de patrimônio e administração próprios, regidos pelo direito privado, a despeito da natureza jurídica de direito público em relação a seu escopo institucional, expressamente previsto em seu Estatuto Social.
- C) possui os mesmos direitos e obrigações típicos das empresas privadas que executem o mesmo objeto, pois, por força de expressa disposição legal, submeteu-se a prévio procedimento licitatório para a constituição de vínculo jurídico com a Administração pública.
- D) desempenha poder de polícia típico da Administração pública direta, prescindindo, pois, de previsão legal para prática de atos de constrição de patrimônio privado, sempre que a medida se mostrar favorável à proteção dos serviços públicos que desempenha.
- E) pode sofrer inflexões do regime jurídico de direito público no que concerne às atividades e bens afetados ao serviço público que executa, a despeito de sua natureza jurídica de direito privado.
Resposta:
A alternativa correta é letra E) pode sofrer inflexões do regime jurídico de direito público no que concerne às atividades e bens afetados ao serviço público que executa, a despeito de sua natureza jurídica de direito privado.
Gabarito: LETRA E.
A questão versa acerca da Administração Pública. Nesse contexto, note que caracteriza a Sociedade de Economia Mista a exigência de forma jurídica de sociedade anônima e capital votante majoritariamente estatal (51% das ações com voto), personalidade jurídica de direito privado, para o desempenho de atividade econômica ou execução de serviço público descentralizado, vinculada à administração indireta. Nesse sentido, vejamos a didática de Vicente Paulo e Marcelo Alexandrino (Direito Administrativo Descomplicado. 23. ed. São Paulo: Método, 2015, p. 72, grifamos):
De outra parte, é possível definir sociedades de economia mista como pessoas jurídicas de direito privado, integrantes da administração indireta, instituídas pelo Poder Público, mediante autorização de lei específica, sob a forma de sociedade anônima, com participação obrigatória de capital privado e público, sendo da pessoa política instituidora ou de entidade da respectiva administração indireta o controle acionário, para a exploração de atividades econômicas ou para a prestação de serviços públicos.
Por conseguinte, vejamos algumas características centrais das sociedades de economia mista:
- Natureza Jurídica da Personalidade: Direito Privado
- Tipo de Serviços: Atua no Domínio Econômico ou Presta Serviços Públicos.
- Regime de Bens: Regime de Direito Privado Mitigado. Bens penhoráveis.
- Formalização de Contratos: Atividades-fim: sem licitação / Atividades-meio: licitação
- Administração: Autonomia Administrativa e Financeira
- Regime de Pessoal: Celetistas (emprego público)
- Formação de Capital: Capital misto. 51% (majoritário) público o restante sempre poderá ser privado.
- Forma Jurídica: Sempre Sociedade Anônima.
De posse dessas informações, vamos analisar os itens para encontrar a resposta correta.
a) submete-se a regime jurídico de direito público, transitoriamente, durante o tempo em que exercer aquele múnus público típico da Administração direta.
Incorreto. Na verdade, a Sociedade de Economia Mista submete-se a regime jurídico de direito privado, com algumas derrogações pelo regime de direito público.
b) é dotada de patrimônio e administração próprios, regidos pelo direito privado, a despeito da natureza jurídica de direito público em relação a seu escopo institucional, expressamente previsto em seu Estatuto Social.
Incorreto. Mesmo que preste serviços públicos, a sociedade de economia mista sempre terá natureza jurídica de direito privado.
c) possui os mesmos direitos e obrigações típicos das empresas privadas que executem o mesmo objeto, pois, por força de expressa disposição legal, submeteu-se a prévio procedimento licitatório para a constituição de vínculo jurídico com a Administração pública.
Incorreto. A sociedade de economia mista é diretamente criada pela Administração, mediante autorização legislativa específica e registro dos atos constitutivos no órgão competente, não havendo que se falar em prévio procedimento licitatório para a constituição de vínculo jurídico com a Administração pública.
d) desempenha poder de polícia típico da Administração pública direta, prescindindo, pois, de previsão legal para prática de atos de constrição de patrimônio privado, sempre que a medida se mostrar favorável à proteção dos serviços públicos que desempenha.
Incorreto. Atualmente, o STF reconhece que a delegação de poder de polícia em favor de sociedade de economia mista é viável mesmo se adotado o regime celetista para as relações de trabalho no âmbito da empresa, desde que a SEM possua capital social majoritariamente público, que prestem exclusivamente serviço público de atuação própria do Estado e em regime não concorrencial. Vejamos:
EMENTA: RECURSO EXTRAORDINÁRIO. REPERCUSSÃO GERAL. TEMA 532. DIREITO CONSTITUCIONAL E ADMINISTRATIVO. PRELIMINARES DE VIOLAÇÃO DO DIREITO À PRESTAÇÃO JURISDICIONAL ADEQUADA E DE USURPAÇÃO DA COMPETÊNCIA DO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL AFASTADAS. PODER DE POLÍCIA. TEORIA DO CICLO DE POLÍCIA. DELEGAÇÃO A PESSOA JURÍDICA DE DIREITO PRIVADO INTEGRANTE DA ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA INDIRETA. SOCIEDADE DE ECONOMIA MISTA. PRESTADORA DE SERVIÇO PÚBLICO DE ATUAÇÃO PRÓPRIA DO ESTADO. CAPITAL MAJORITARIAMENTE PÚBLICO. REGIME NÃO CONCORRENCIAL. CONSTITUCIONALIDADE. NECESSIDADE DE LEI FORMAL ESPECÍFICA PARA DELEGAÇÃO. CONTROLE DE ABUSOS E DESVIOS POR MEIO DO DEVIDO PROCESSO. CONTROLE JUDICIAL DO EXERCÍCIO IRREGULAR. INDELEGABILIDADE DE COMPETÊNCIA LEGISLATIVA.
[...]
6. Consectariamente, a Constituição, ao autorizar a criação de empresas públicas e sociedades de economia mista que tenham por objeto exclusivo a prestação de serviços públicos de atuação típica do Estado e em regime não concorrencial, autoriza, consequentemente, a delegação dos meios necessários à realização do serviço público delegado. Deveras: a) A admissão de empregados públicos deve ser precedida de concurso público, característica que não se coaduna com a despedida imotivada; b) o RE 589.998, esta Corte reconheceu que a ECT, que presta um serviço público em regime de monopólio, deve motivar a dispensa de seus empregados, assegurando-se, assim, que os princípios observados no momento da admissão sejam, também, respeitados por ocasião do desligamento; c) Os empregados públicos se submetem, ainda, aos princípios constitucionais de atuação da Administração Pública constantes do artigo 37 da Carta Política. Assim, eventuais interferências indevidas em sua atuação podem ser objeto de impugnação administrativa ou judicial; d) Ausente, portanto, qualquer incompatibilidade entre o regime celetista existente nas estatais prestadoras de serviço público em regime de monopólio e o exercício de atividade de polícia administrativa pelos seus empregados.
7. As estatais prestadoras de serviço público de atuação própria do Estado e em regime não concorrencial podem atuar na companhia do atributo da coercibilidade inerente ao exercício do poder de polícia, mormente diante da atração do regime fazendário.
[...]
12. Ex positis, voto no sentido de (i) CONHECER e DAR PROVIMENTO ao recurso extraordinário interposto pela Empresa de Transporte e Trânsito de Belo Horizonte – BHTRANS e (ii) de CONHECER e NEGAR PROVIMENTO ao recurso extraordinário interposto pelo Ministério Público do Estado de Minas Gerais, para reconhecer a compatibilidade constitucional da delegação da atividade de policiamento de trânsito à Empresa de Transporte e Trânsito de Belo Horizonte – BHTRANS, nos limites da tese jurídica objetivamente fixada pelo Pleno do Supremo Tribunal Federal.
13. Repercussão geral constitucional que assenta a seguinte tese objetiva: “É constitucional a delegação do poder de polícia, por meio de lei, a pessoas jurídicas de direito privado integrantes da Administração Pública indireta de capital social majoritariamente público que prestem exclusivamente serviço público de atuação própria do Estado e em regime não concorrencial.” (RE 633782, Relator(a): LUIZ FUX, Tribunal Pleno, julgado em 26/10/2020, PROCESSO ELETRÔNICO REPERCUSSÃO GERAL - MÉRITO DJe-279 DIVULG 24-11-2020 PUBLIC 25-11-2020)
e) pode sofrer inflexões do regime jurídico de direito público no que concerne às atividades e bens afetados ao serviço público que executa, a despeito de sua natureza jurídica de direito privado.
Correto. As Sociedades de Economia Mista são pessoas jurídicas de Direito Privado e atuam em regime híbrido público-privado, com mitigação de algumas normas de direito privado pelo direito público. Assim, as empresas estatais (sociedades de economia mista e empresas públicas) possuem o regime jurídico híbrido, isto é, submetem-se predominantemente ao regime de Direito Privado, porém com derrogações do direito público, conforme informa Maria Sylvia Zanella Di Pietro (Direito Administrativo. 27. ed. São Paulo: Atlas, 2014, p. 496):
No entanto, tais pessoas nunca se sujeitam inteiramente ao direito privado. O seu regime jurídico é híbrido, porque, sob muitos aspectos, elas se submetem ao direito público, tendo em vista especialmente a necessidade de fazer prevalecer a vontade do ente estatal, que as criou para atingir determinado fim de interesse público.
Portanto, gabarito LETRA E.
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