Francisco possui imóvel localizado em zona urbana e resolveu transformar seu quintal em um canil, para receber cachorros abandonados. Por ter recebido diversas reclamações, a fiscalização municipal realizou vistoria no local, verificando a existência de centenas de animais em condições inadequadas, com grave risco à saúde pública e ao meio ambiente. Após regular processo administrativo, o Município expediu notificação ao proprietário, determinando a remoção dos animais, enquanto não forem obtidas todas as licenças e autorizações legais necessárias. A conduta do Município está:
- A) errada, pois houve flagrante abuso de poder por parte da municipalidade, eis que os animais também integram o meio ambiente e são protegidos por lei;
- B) errada, pois houve flagrante abuso de poder por parte da municipalidade, por ofensa ao direito de propriedade;
- C) correta, pois o Município possui prerrogativa de limitar o direito de propriedade, em razão de seu poder de polícia, independentemente do atendimento ao interesse público;
- D) correta, pois o Município agiu no regular exercício de seu poder de polícia, diante da supremacia do interesse público sobre o privado;
- E) correta, desde que o Município tenha recorrido previamente ao Poder Judiciário para poder limitar o uso da propriedade privada.
Resposta:
A alternativa correta é letra D) correta, pois o Município agiu no regular exercício de seu poder de polícia, diante da supremacia do interesse público sobre o privado;
A questão aborda o tema Poderes da Administração Pública. Nesse contexto, a administração pública, no exercício do Poder de Polícia, interfere na órbita do interesse privado para salvaguardar o interesse público, restringindo direitos individuais. Desse modo, percebamos que o conceito de PODER DE POLÍCIA está presente no art. 78 do CTN:
Art. 78. Considera-se PODER DE POLÍCIA atividade da administração pública que, limitando ou disciplinando direito, interêsse ou liberdade, regula a prática de ato ou abstenção de fato, em razão de intêresse público concernente à segurança, à higiene, à ordem, aos costumes, à disciplina da produção e do mercado, ao exercício de atividades econômicas dependentes de concessão ou autorização do Poder Público, à tranqüilidade pública ou ao respeito à propriedade e aos direitos individuais ou coletiv
O poder de Polícia serve para restringir a esfera de interesses do particular, pois é o mecanismo que dispõe a Administração Pública para conter os abusos do direito individual. Vejamos nas lições de Hely Lopes Meirelles (Direito Administrativo Brasileiro. 42. ed. São Paulo: Malheiros, 2016, p. 134):
Em linguagem menos técnica, podemos dizer que o poder de polícia é o mecanismo de frenagem de que dispõe a Administração Pública para conter os abusos do direito individual. Por esse mecanismo, que faz parte de toda Administração, o Estado detém a atividade dos particulares que se revelar contrária, nociva ou inconveniente ao bem-estar social, ao desenvolvimento e à segurança nacional.
Desse modo, o Poder Público, ao determinar a remoção dos animais, age visando interesse público, limitando ou disciplinando o direito individual do proprietário, uma vez que verificou-se a existência de centenas de animais em condições inadequadas, com grave risco à saúde pública e ao meio ambiente. Com efeito, a conduta do Município está correta, pois o Município agiu no regular exercício de seu poder de polícia, diante da supremacia do interesse público sobre o privado.
Portanto, gabarito LETRA D.
Analisemos as demais alternativas para encontrarmos seus erros.
a) errada, pois houve flagrante abuso de poder por parte da municipalidade, eis que os animais também integram o meio ambiente e são protegidos por lei;
Incorreto. Não houve abuso de poder, pois os ditames legais foram respeitados e o Município agiu no regular uso do poder de polícia.
b) errada, pois houve flagrante abuso de poder por parte da municipalidade, por ofensa ao direito de propriedade;
Incorreto. Dada a supremacia do interesse público sobre o privado, o poder público, para atender o interesse coletivo, poderá limitar os direitos individuais, inclusive o de propriedade.
c) correta, pois o Município possui prerrogativa de limitar o direito de propriedade, em razão de seu poder de polícia, independentemente do atendimento ao interesse público;
Incorreto. O elemento finalidade do ato administrativo subdivide-se em duas vertentes: finalidade específica e geral. A finalidade específica é o fim que se espera alcançar com a prática do ato. Por sua vez, a finalidade geral ou mediata sempre será a satisfação do interesse público. Desse modo, toda atuação administrativa deverá ser pautada na busca pelo interesse público.
e) correta, desde que o Município tenha recorrido previamente ao Poder Judiciário para poder limitar o uso da propriedade privada.
Incorreto. O poder de polícia é um poder, via de regra, autoexecutório, uma vez que a Administração pode pôr em execução as suas decisões, sem precisar recorrer previamente ao Poder Judiciário, não estando este atributo presentes em todos os atos, conforme lição de Maria Sylvia di Pietro (Direito Administrativo. 27. ed. São Paulo: Atlas, 2014, p. 127)
A autoexecutoriedade não existe em todas as medidas de polícia. Para que a Administração possa se utilizar dessa faculdade, é necessário que a lei a autorize expressamente, ou que se trate de medida urgente, sem a qual poderá ser ocasionado prejuízo maior para o interesse público.
Detalhe: Contudo, perceba que nem toda atuação de polícia administrativa assim o é. Peguemos como exemplo a multa. Sanção administrativa, decorrente do poder de polícia, que pode ser IMPOSTA ao particular por meio de ato administrativo. Todavia, a sua cobrança só se dará por meio de ação autônoma perante o Poder Judiciário, vale dizer, não pode a administração autoexecutar a cobrança de valores em dinheiro (pecuniários). Vejamos nas lições de Vicente Paulo e Marcelo Alexandrino (Direito Administrativo Descomplicado. 23. ed. São Paulo: Método, 2015, p. 276):
Nem toda atuação de polícia administrativa, contudo, pode ser levada a termo de forma autoexecutória. Exemplo consagrado de ato não autoexecutório é a cobrança de multas administrativas de polícia, quando resistida pelo particular . Nesse caso, a imposição da multa é efetuada pela administração pública sem necessidade de qualquer participação do Poder Judiciário. Entretanto, a cobrança forçada dessa multa aplicada no exercício do poder de polícia e não paga pelo administrado somente pode ser efetivada por meio de uma ação judicial de execução.
Desse modo, confirma-se gabarito LETRA D.
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