Lourival, servidor público municipal estável, no âmbito de suas atribuições, relacionadas ao exercício do poder de polícia, verificou a existência de uma obra irregular, que está colocando em risco a vida e a saúde dos respectivos operários e da população que transita no local, bem como a incolumidade das casas do entorno.
Em razão disso, o responsável pela construção já foi multado por três vezes, além de ter sido determinado o embargo da obra, após o devido processo administrativo, nos termos da lei local, sem qualquer sucesso, considerando que tal irregularidade vem se perpetuando.
Considerando que a norma local também prevê a possibilidade de demolição de obras que se enquadrem em tais circunstâncias, Lourival está com fundadas dúvidas acerca da viabilidade de a Administração levar a efeito tal destruição do imóvel, sem a intervenção do Judiciário.
Acerca dessa situação hipotética, considerando os atributos do poder de polícia e a orientação do Superior Tribunal de Justiça, é correto afirmar que é:
- A) viável que a Administração leve a efeito a demolição sem a intervenção do Judiciário, em decorrência da autoexecutoriedade do poder de polícia, atributo de que não goza sanção de multa;
- B) inviável que a Administração leve a efeito a demolição sem a autorização do Judiciário, na medida em que a autoexecutoriedade do poder de polícia não admite meios diretos de coerção, ainda que de forma proporcional;
- C) viável que a Administração leve a efeito a demolição sem a intervenção do Judiciário, considerando que todas as medidas e sanções de polícia mencionadas são dotadas do atributo da autoexecutoriedade do poder de polícia;
- D) inviável que a Administração venha a ajuizar ação para fins de levar a efeito a demolição do imóvel em questão, em razão da falta de interesse de agir, fulminada pelo atributo da exigibilidade do poder de polícia;
- E) inviável que a Administração leve a efeito as medidas e sanções de polícia descritas, pois não se lhes pode reconhecer o atributo da autoexecutoriedade, sendo dotadas apenas de exigibilidade, dependendo, portanto, de decisão judicial para a sua implementação.
Resposta:
A alternativa correta é letra A) viável que a Administração leve a efeito a demolição sem a intervenção do Judiciário, em decorrência da autoexecutoriedade do poder de polícia, atributo de que não goza sanção de multa;
Gabarito: letra A.
a) viável que a Administração leve a efeito a demolição sem a intervenção do Judiciário, em decorrência da autoexecutoriedade do poder de polícia, atributo de que não goza sanção de multa; - certa.
Na lição de Maria Sylvia Zanella Di Pietro:
O privilège d’action d’office consiste na faculdade que tem a Administração, quando já tomou decisão executória, de realizar diretamente a execução forçada, usando, se for o caso, da força pública para obrigar o administrado a cumprir a decisão.
Pelo atributo da exigibilidade, a Administração se vale de meios indiretos de coação. Cite-se, como exemplo, a multa; ou a impossibilidade de licenciamento do veículo enquanto não pagas as multas de trânsito.
Pelo atributo da autoexecutoriedade, a Administração compele materialmente o administrado, usando meios diretos de coação. Por exemplo, ela dissolve uma reunião, apreende mercadorias, interdita uma fábrica.
A autoexecutoriedade não existe em todas as medidas de polícia. Para que a Administração possa se utilizar dessa faculdade, é necessário que a lei a autorize expressamente, ou que se trate de medida urgente, sem a qual poderá ser ocasionado prejuízo maior para o interesse público. No primeiro caso, a medida deve ser adotada em consonância com o procedimento legal, assegurando-se ao interessado o direito de defesa, previsto expressamente no artigo 5º, inciso LV, da Constituição.
No segundo caso, a própria urgência da medida dispensa a observância de procedimento especial, o que não autoriza a Administração a agir arbitrariamente ou a exceder-se no emprego da força, sob pena de responder civilmente o Estado pelos danos causados (cf. art. 37, § 6o, da Constituição), sem prejuízo da responsabilidade criminal, civil e administrativa dos servidores envolvidos.
Em resumo, pode-se dizer que a exigibilidade está presente em todas as medidas de polícia, mas não a executoriedade (privilège d’action d’office).
FONTE: DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella. Direito Administrativo. 31ª ed. São Paulo: Atlas, 2018. P. 198
Nessa linha, nota-se que no caso trazido pelo enunciado é viável que a Administração leve a efeito a demolição sem a intervenção do Judiciário, em decorrência da autoexecutoriedade do poder de polícia.
A sanção de multa, apesar de possui exigibilidade – meios indiretos de coação – não goza da autoexecutoriedade, visto que para que a multa seja cobrada é necessário o ajuizamento de ação de execução perante o Poder Judiciário.
Logo, a alternativa correta a ser assinalada é a letra A.
Vejamos os erros das demais alternativas:
b) inviável que a Administração leve a efeito a demolição sem a autorização do Judiciário, na medida em que a autoexecutoriedade do poder de polícia não admite meios diretos de coerção, ainda que de forma proporcional; - errada.
Conforme visto acima, o atributo da autoexecutoriedade utiliza justamente os meios diretos de coação, tornando possível a demolição sem a intervenção do Judiciário.
c) viável que a Administração leve a efeito a demolição sem a intervenção do Judiciário, considerando que todas as medidas e sanções de polícia mencionadas são dotadas do atributo da autoexecutoriedade do poder de polícia; - errada.
De acordo com o que fora explicitado acima, a autoexecutoriedade não existe em todas as medidas de polícia. Para que a Administração possa se utilizar dessa faculdade, é necessário que a lei a autorize expressamente, ou que se trate de medida urgente.
d) inviável que a Administração venha a ajuizar ação para fins de levar a efeito a demolição do imóvel em questão, em razão da falta de interesse de agir, fulminada pelo atributo da exigibilidade do poder de polícia; - errada.
Em verdade, o entendimento do Superior Tribunal de Justiça é em sentido contrário ao que nos trouxe a alternativa.
Vejamos:
“Um dos atributos do poder de polícia é a autoxecutoriedade. Isso significa que a Administração Pública pode, com os seus próprios meios, executar seus atos e decisões, sem precisar de prévia autorização judicial.
A Administração, contudo, pode, em vez de executar o próprio ato, ingressar com ação judicial pedindo que o Poder Judiciário determine essa providência ao particular.
Ex: diante de uma irregularidade grave, a Administração Pública poderia, em tese, interditar o estabelecimento. Se ela, em vez de executar esta ordem diretamente, ajuíza ação pedindo que o Poder Judiciário determine essa providência, tal ação não pode ser julgada extinta por falta de interesse de agir.
A autoexecutoriedade não retira da Administração Pública a possibilidade de valer-se de decisão judicial que lhe assegure a providência fática que almeja, pois nem sempre as medidas tomadas pelo Poder Público no exercício do poder de polícia são suficientes.
STJ. 2ª Turma. REsp 1651622/SP, Rel. Min. Herman Benjamin, julgado em 28/03/2017.” (CAVALCANTE, Márcio André Lopes. A administração pública possui interesse de agir para tutelar em juízo atos em que ela poderia atuar com base em seu poder de polícia. Buscador Dizer o Direito, Manaus. Disponível em: <https://www.buscadordizerodireito.com.br/jurisprudencia/detalhes/2e2079d63348233d91cad1fa9b1361e9>. Acesso em: 14/11/2023)
e) inviável que a Administração leve a efeito as medidas e sanções de polícia descritas, pois não se lhes pode reconhecer o atributo da autoexecutoriedade, sendo dotadas apenas de exigibilidade, dependendo, portanto, de decisão judicial para a sua implementação. - errada.
De acordo com o que fora explicitado, a Administração Pública, possui, nesse caso, o atributo da autoexecutoriedade dos seus atos.
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