A política externa introduzida pelo governo de Getúlio Vargas entre 1935 e 1941 foi denominada, por Gerson Moura (1980), de “equidistância pragmática”. Acerca dessa política, assinale a alternativa correta.
- A) O governo Vargas rompeu com o paradigma americanista da diplomacia brasileira e inaugurou o paradigma universalista, ao estabelecer relações comerciais inéditas com a Alemanha.
- B) O Brasil praticava, simultaneamente, o comércio compensado com a Alemanha e com os Estados Unidos, por meio do qual exportava produtos industrializados e importava equipamentos militares.
- C) A diplomacia brasileira manteve uma política de barganha com a Alemanha e com os Estados Unidos, negociando a adesão a uma das partes na Segunda Guerra Mundial mediante a obtenção de vantagens econômicas.
- D) O Brasil assinou um acordo com cláusula de nação mais favorecida com os Estados Unidos em 1935, cujos objetivos eram diminuir a dependência comercial da Itália e conter a propagação do fascismo no sul do país.
- E) O governo brasileiro deixou de participar de iniciativas panamericanas na década de 1930, na medida em que o Brasil não precisou contar com o apoio de países latino-americanos para contrapor o poder dos Estados Unidos no hemisfério ocidental.
Resposta:
A alternativa correta é letra C) A diplomacia brasileira manteve uma política de barganha com a Alemanha e com os Estados Unidos, negociando a adesão a uma das partes na Segunda Guerra Mundial mediante a obtenção de vantagens econômicas.
Gabarito: ALTERNATIVA C
- A política externa introduzida pelo governo de Getúlio Vargas entre 1935 e 1941 foi denominada, por Gerson Moura (1980), de “equidistância pragmática”. Acerca dessa política, assinale a alternativa correta.
Em primeiro lugar, precisa sempre o estudante ter claro que a adesão brasileira às democracias liberais não foi um percurso óbvio, mas sim um processo acidentado da política externa brasileira. No plano doméstico, Vargas não economizava nas críticas contra a democracia liberal, denunciando-a como um regime fraco e propenso a crises, além de alardear que regimes desse tipo são as vítimas preferidas tanto das grandes crises econômicas quanto da expansão internacional do comunismo. Internacionalmente, Vargas afirmava seu compromisso irrestrito com o desenvolvimento (industrial) brasileiro, o que implicava numa posição neutra ao extremo em relação aos conflitos e às rivalidades internacionais. Na segunda metade da década de 1930, configurar-se-ia a chamada "equidistância pragmática" entre Alemanha e Estados Unidos, segundo a qual o Brasil celebrou tratados de comércio com as duas potências e manteve relações político-comerciais muito dinâmicas com ambas. Percebia-se na disputa internacional entre as grandes potências uma chance de ampliar as margens de manobra do Brasil, explorando suas rivalidades e contradições para viabilizar o projeto desenvolvimentista. Isto é, domesticamente, a forma de governar guardava muitas semelhanças e flertes com a via nazifascista, incluindo o caráter totalitário da Constituição de 1937; e, internacionalmente, o Brasil agia sem assumir compromissos claros e definitivos com nenhum dos dois campos, mas sim buscando meios para viabilizar sua industrialização. E é importante que se perceba que as tensões internacionais e as dificuldades da guerra faziam com que a tolerância internacional frente a esse comportamento fosse ampliada de maneira generosa, permitindo com que o Brasil estendesse ao máximo as contradições de sua neutralidade.
Apenas com a entrada dos EUA na guerra (dezembro de 1941), a equidistância pragmática seria estrangulada e o Brasil se aproximaria da tomada crítica de decisão. Mesmo assim, o governo brasileiro ainda levaria cerca de oito meses para fixar os termos de seu engajamento e de seu apoio ao lado dos aliados na guerra, desenvolvendo antes uma longa negociação com os EUA procurando conseguir recursos para o desenvolvimentismo brasileiro em troca do apoio contra o Eixo. Naquele momento, era importante garantir o alinhamento brasileiro para estrangular o fornecimento de matérias primas estratégicas para o esforços de guerra alemão e, por outro lado, garantir posições preciosas para a campanha aliada sobre o Norte da África. O Nordeste brasileiro era o melhor ponto para sediar as bases aéreas americanas para lançar campanhas de bombardeio contra as posições nazistas na África, apoio importante para as ações de infantaria na libertação da região. Essas duas componentes foram usadas como moedas de troca pelo Brasil para conseguir programas amplos de cooperação em favor do desenvolvimento brasileiro. A urgência da guerra pesava em favor dos pedidos brasileiros e os EUA aceitaram estabelecer um convênio de cooperação técnica e financeira para a instalação da Companhia Siderúrgica Nacional (CSN), passo fundamental no esforço desenvolvimentista brasileiro.
Se, por um lado, não era viável a manutenção da equidistância, por outro, a pressa americana em contar com as matérias prima brasileiras e com as posições militares no nordeste brasileiro mantinha certa vantagem da diplomacia brasileira. Nessa mudança de posição, o Brasil entrou em posição privilegiada para definir os termos de sua entrada no conflito mundial. Entre as conquistas da diplomacia brasileira, destacam-se a admissão das tropas brasileiras no teatro de guerra europeu, o que era vista com reservas pelos Aliados, e os excelentes termos de troca das matérias prima para o esforço de guerra e a instalação da Companhia Siderúrgica Nacional (CSN) em Volta Redonda. Pelos termos do acordo, o Brasil cederia posições estratégicas para as tropas americanas além de romper todo o comércio com a Alemanha em troca de importantes investimentos americanos, dentre os quais se destaca a implantação da planta siderúrgica no Brasil, o que seria fundamental para o nacional-desenvolvimentismo de Vargas. Assim, observemos as alternativas propostas.
a) O governo Vargas rompeu com o paradigma americanista da diplomacia brasileira e inaugurou o paradigma universalista, ao estabelecer relações comerciais inéditas com a Alemanha.
b) O Brasil praticava, simultaneamente, o comércio compensado com a Alemanha e com os Estados Unidos, por meio do qual exportava produtos industrializados e importava equipamentos militares.
c) A diplomacia brasileira manteve uma política de barganha com a Alemanha e com os Estados Unidos, negociando a adesão a uma das partes na Segunda Guerra Mundial mediante a obtenção de vantagens econômicas.
d) O Brasil assinou um acordo com cláusula de nação mais favorecida com os Estados Unidos em 1935, cujos objetivos eram diminuir a dependência comercial da Itália e conter a propagação do fascismo no sul do país.
e) O governo brasileiro deixou de participar de iniciativas panamericanas na década de 1930, na medida em que o Brasil não precisou contar com o apoio de países latino-americanos para contrapor o poder dos Estados Unidos no hemisfério ocidental.
Ainda que se possa, sim, entender que a única alternativa possível é a C, precisamos observar que a construção da banca foi extremamente infeliz. Os termos de negociação propostos pelo brasileiro não foram "vantagens econômicas", mas sim toda uma estratégia muito mais complexa de industrialização do país e de reequipamento das nossas Forças Armadas - o que poderia ser alcançado com o auxílio de ambas as potências. Por outro lado, a moeda de barganha brasileira não era sua adesão a um dos lados na guerra, fato que, no teatro de operações, não era uma preocupação central para as grandes potências. O que estava em discussão era o acesso sistemático às matérias primas estratégicas que o Brasil poderia fornecer para as economias de guerra de ambos os países.
Sobre isso, é importante que o estudante observe que, na primeira metade do século XX, eram poucos os substitutos sintéticos que poderiam ser usados em escala industrial, o que exigia, em muitos casos, o emprego de matérias primas oriundas do extrativismo, como a borracha natural. O Brasil, obviamente, era um grande fornecedor desse tipo de material, que seriam fundamentais para abastecer as indústrias bélicas para a fabricação desde a sola de coturnos até o isolamento térmico de aeronaves. Por isso, o país ganhou uma grande margem de manobra internacional, permitindo pressionar grandes potências num contexto internacional muito mais delicado. Ou seja, os termos de negociação foram completamente diferentes daqueles apresentados pela banca. Assim, inexistindo possibilidade correta de resposta, a questão deveria ser ANULADA.
Nosso gabarito: ANULADA
Gabarito da banca: ALTERNATIVA C
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