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“Infelicidade! Nossos cidadãos encarcerados nesses locais, Servem para cimentar esse alojamento odioso; Com as próprias mãos eles erguem, nos ferros aviltados, Essa morada do orgulho e da tirania. Mas, creia-me, no momento em que eles virem seus vingadores Eles mesmos destruirão essa assustadora obra, Instrumento de sua vergonha e de sua escravidão” Com esses dizeres, um “americano” do Peru conclama seu povo à libertação da escravidão na peça dramática Alzira, […], escrita por Voltaire em 1736. O texto é piedoso com a sorte dos escravos do Novo Mundo, demonstra simpatia por sua revolta e saúda a possibilidade de uma reconciliação final baseada na liberdade coletiva. Em 1766, o francês Joseph Mosneron assistiu à representação dessa obra a bordo do navio [francês][…]. Comoveu-se com os versos que ouviu, apesar de a princesa Alzira, a heroína que dá nome ao romance, ser representada por um vigoroso marinheiro com ares de Hércules. Enquanto o pontilhão servia de palco [improvisado] para os atores, nos porões embaixo dele aglomeravam-se centenas de seres humanos capturados na África. Eles estavam sendo transportados, justamente, para o Caribe. Como explicar essa esquizofrenia? Como é possível que Mosneron tenha se abalado com a peça e não com os personagens reais que a inspiraram? Suponho que o próprio texto de Alzira contribui para isso, ao evocar a escravidão apenas dos “americanos”, e omitir qualquer menção ao tráfico transatlântico de africanos, em pleno apogeu quando Voltaire escreveu a peça. […]. O século das Luzes, que assistiu à insurreição da filosofia contra o monarquismo, o absolutismo e a Igreja, foi também o ápice da expansão desse comércio absurdo. A França enviou, no total, 1,1 milhão de escravos para as colônias […] antes da proibição definitiva do tráfico, em 1831. A abolição seria instituída em territórios franceses apenas em 1848. Na verdade, esse tipo de negócio já era quase clandestino desde 3 de julho de 1315, quando um édito de Luís X baniu a possibilidade de escravidão em todo o reino. Porém, no século XV, a demanda por mão-de-obra aumentou nas colônias e fez-se necessário tomar certas atitudes. A solução inicial foi explorar as populações locais, exterminadas com rapidez. Recorreu-se, então, aos “alistados” brancos, homens geralmente forçados ao exílio que assinavam contratos válidos por três anos e eram tratados nas mesmas condições que os negros. Um panfleto anônimo, ‘Sobre a necessidade de se adotar a escravidão na França’, expressa a visão da época: era preciso ‘colocar pobres e indigentes para trabalhar’. Menosprezos racial e de classe não são incompatíveis [com a França iluminista]? […] GRESH, Alain. Escravidão à francesa. Le Monde Diplomatique. 1 abril 2008. Disponível em: http://diplomatique.org.br/escravidao-a-francesa/ Acesso em: 10 ago. 2017. [Adaptado] A partir das considerações indicadas na matéria, as quais apontam a influência histórica dos pensadores iluministas e da participação francesa nos debates sobre liberdade e cidadania, é CORRETO afirmar.  

“Infelicidade! Nossos cidadãos encarcerados nesses locais,
Servem para cimentar esse alojamento odioso;
Com as próprias mãos eles erguem, nos ferros aviltados,
Essa morada do orgulho e da tirania.
Mas, creia-me, no momento em que eles virem seus vingadores
Eles mesmos destruirão essa assustadora obra,
Instrumento de sua vergonha e de sua escravidão”
Com esses dizeres, um “americano” do Peru conclama seu povo à libertação da escravidão na peça dramática
Alzira, […], escrita por Voltaire em 1736. O texto é piedoso com a sorte dos escravos do Novo Mundo,
demonstra simpatia por sua revolta e saúda a possibilidade de uma reconciliação final baseada na liberdade
coletiva.
Em 1766, o francês Joseph Mosneron assistiu à representação dessa obra a bordo do navio [francês][…].
Comoveu-se com os versos que ouviu, apesar de a princesa Alzira, a heroína que dá nome ao romance, ser
representada por um vigoroso marinheiro com ares de Hércules. Enquanto o pontilhão servia de palco
[improvisado] para os atores, nos porões embaixo dele aglomeravam-se centenas de seres humanos
capturados na África. Eles estavam sendo transportados, justamente, para o Caribe.
Como explicar essa esquizofrenia? Como é possível que Mosneron tenha se abalado com a peça e não com
os personagens reais que a inspiraram? Suponho que o próprio texto de Alzira contribui para isso, ao evocar
a escravidão apenas dos “americanos”, e omitir qualquer menção ao tráfico transatlântico de africanos, em
pleno apogeu quando Voltaire escreveu a peça. […].
O século das Luzes, que assistiu à insurreição da filosofia contra o monarquismo, o absolutismo e a Igreja,
foi também o ápice da expansão desse comércio absurdo. A França enviou, no total, 1,1 milhão de escravos
para as colônias […] antes da proibição definitiva do tráfico, em 1831. A abolição seria instituída em
territórios franceses apenas em 1848.
Na verdade, esse tipo de negócio já era quase clandestino desde 3 de julho de 1315, quando um édito de Luís
X baniu a possibilidade de escravidão em todo o reino. Porém, no século XV, a demanda por mão-de-obra
aumentou nas colônias e fez-se necessário tomar certas atitudes. A solução inicial foi explorar as populações
locais, exterminadas com rapidez. Recorreu-se, então, aos “alistados” brancos, homens geralmente forçados
ao exílio que assinavam contratos válidos por três anos e eram tratados nas mesmas condições que os negros.
Um panfleto anônimo, ‘Sobre a necessidade de se adotar a escravidão na França’, expressa a visão da época:
era preciso ‘colocar pobres e indigentes para trabalhar’. Menosprezos racial e de classe não são
incompatíveis [com a França iluminista]? […]
GRESH, Alain. Escravidão à francesa. Le Monde Diplomatique. 1 abril 2008. Disponível em:
http://diplomatique.org.br/escravidao-a-francesa/ Acesso em: 10 ago. 2017. [Adaptado]
A partir das considerações indicadas na matéria, as quais apontam a influência histórica dos pensadores
iluministas e da participação francesa nos debates sobre liberdade e cidadania, é CORRETO afirmar.  

Resposta:

A alternativa correta é E)

O texto apresentado revela uma contradição histórica no período do Iluminismo francês, onde ideais de liberdade e igualdade conviveram com a prática da escravidão nas colônias. A peça "Alzira", de Voltaire, ilustra essa dissonância ao retratar a luta pela liberdade dos "americanos" enquanto ignorava o tráfico transatlântico de africanos, que atingia seu auge justamente naquela época.

O caso de Joseph Mosneron, comovido pela peça mas indiferente aos escravos reais no porão do navio, exemplifica essa esquizofrenia moral. A França, berço do pensamento iluminista que contestava o absolutismo e a Igreja, foi também uma das principais nações escravagistas, transportando mais de um milhão de africanos para suas colônias.

O texto demonstra como os princípios de "liberdade, igualdade e fraternidade" não foram aplicados de forma universal, mantendo-se restritos a certos grupos sociais e étnicos. Essa contradição histórica ajuda a explicar os conflitos sociais contemporâneos na França, onde desigualdades étnicas e de classe permanecem sem solução.

Portanto, a alternativa correta é a E), que reconhece que as tensões atuais na França refletem justamente a permanência dessas desigualdades não resolvidas, demonstrando que os ideais iluministas de liberdade e cidadania ainda não foram plenamente alcançados para todos os cidadãos franceses.

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