Questões Sobre Tempo, Memória e Cultura - História - concurso

O ensaio a seguir discute a análise de Todorov sobre a visão do outro durante o descobrimento da América, com base nas alternativas apresentadas.

A obra de Todorov aborda a complexa relação entre os espanhóis e os povos indígenas durante a conquista da América, destacando o desconhecimento e a incompreensão do outro como fatores determinantes para os conflitos e massacres ocorridos. Sua tese central não se limita apenas à superioridade militar ou tecnológica dos espanhóis, mas também à incapacidade de comunicação e entendimento mútuo, o que resultou em violência e dominação.

A alternativa I afirma que Todorov traça conexões entre os discursos da época e as relações de poder. Embora ele analise documentos históricos, sua abordagem não se restringe apenas a essa perspectiva, mas também explora a dimensão semiótica e cultural. Portanto, essa afirmação não capta plenamente o escopo de sua análise.

A alternativa II menciona que a vitória espanhola se deveu à incapacidade indígena de entender e comunicar-se com o outro. Embora Todorov discuta as diferenças comunicativas, ele não atribui a derrota dos Astecas exclusivamente a essa questão, mas sim a um conjunto de fatores, incluindo a visão de mundo dos espanhóis e sua interpretação do outro como inferior. Logo, essa afirmação é reducionista.

A alternativa III está correta, pois Todorov de fato utiliza documentos como cartas e diários dos conquistadores e missionários, analisando-os sob uma perspectiva semiótica. Sua leitura vai além do conteúdo histórico, explorando as estruturas discursivas e os significados culturais presentes nesses textos.

Por fim, a alternativa IV também está correta, pois Todorov problematiza a falta de conhecimento e compreensão dos espanhóis em relação aos indígenas. Ele demonstra que o contato entre esses povos não levou ao diálogo, mas sim à destruição e ao extermínio, reforçando sua tese sobre a alteridade e a violência decorrente do desconhecimento do outro.

Dessa forma, as alternativas III e IV são as que melhor representam as ideias de Todorov, confirmando que o gabarito correto é a opção E.

O trabalho de Marc Bloch, "Reis Taumaturgos", representou uma transformação significativa na historiografia ao introduzir uma abordagem que integrava o imaginário e o mágico ao estudo do poder político. A partir dessa perspectiva, analisemos as afirmativas apresentadas:

1. A nova história política permitiu historicizar o que antes era considerada apenas como anedota.

Verdadeiro. A contribuição de Bloch foi justamente tratar elementos antes vistos como lendários ou supersticiosos — como o poder de cura dos reis — como objetos dignos de análise histórica, inserindo-os em um contexto cultural e político mais amplo.

2. O fenômeno atribuído aos reis franceses e ingleses de curar escrófulas com o toque das mãos é característico do medievo, e tais ritos não poderiam ser difundidos na modernidade.

Falso. Embora a prática tenha raízes medievais, ela persistiu até o século XVIII, mesmo com o avanço da medicina. A crença no poder sobrenatural dos reis resistiu parcialmente às transformações do pensamento racionalista, mostrando a complexidade da relação entre poder e imaginário.

3. O caráter sobrenatural do poder dos reis franceses e ingleses tem elementos de legitimidade anteriores às dinastias Capetingia e Plantageneta.

Verdadeiro. A sacralização do poder monárquico remonta a figuras como Pepino, o Breve, no século VIII, que utilizou a unção régia, inspirada no Antigo Testamento, para consolidar sua autoridade. Esse ritual reforçava a ideia de um direito divino, antecedendo e influenciando as dinastias posteriores.

Portanto, a sequência correta é V-F-V, correspondente à alternativa A).

De acordo com o historiador Perry Anderson, a Itália, apesar de ter sido pioneira na criação de muitas técnicas do sistema absolutista, não conseguiu consolidar um Estado absolutista em nível nacional. O autor explica esse fenômeno histórico destacando que o absolutismo era essencialmente uma reestruturação do Estado feudal em escala nacional. No caso italiano, o desenvolvimento precoce do capital mercantil nas cidades do norte atuou como um fator impeditivo, pois fragmentou o poder e impediu a centralização política necessária para o surgimento de um Estado absoluto unificado.

A opção correta, portanto, é a D), que aponta justamente essa contradição: enquanto em outras regiões da Europa o absolutismo surgiu como uma resposta à necessidade de unificação e fortalecimento do poder monárquico, na Itália o vigor do capital mercantil urbano e a fragmentação política impediram esse processo. As demais alternativas, embora apresentem elementos relevantes do contexto italiano, não capturam a explicação central de Anderson sobre a relação entre o desenvolvimento econômico das cidades do norte e a impossibilidade de um absolutismo nacional.

A história das mulheres surge como um campo de estudo essencial para desconstruir as narrativas tradicionais que, durante séculos, invisibilizaram a participação feminina na sociedade. Como aponta Rachel Soihet, inspirada na perspectiva de Lucien Febvre, não se pode falar de uma única "história da mulher", mas sim de "histórias das mulheres", dada a diversidade de experiências marcadas por diferenças sociais, étnicas, religiosas e culturais. Essa abordagem plural reflete a necessidade de reconhecer as mulheres como sujeitos históricos ativos, cujas trajetórias foram sistematicamente negligenciadas pela historiografia tradicional.

A primeira afirmação é verdadeira (V), pois a história cultural, ao ampliar seus objetos de estudo, permitiu que as mulheres fossem incluídas como protagonistas de suas próprias narrativas. A segunda afirmação é falsa (F), já que as lutas sociais estão intrinsecamente ligadas à história das mulheres, seja através do feminismo, dos movimentos por direitos trabalhistas ou da resistência contra opressões estruturais. Por fim, a terceira afirmação é verdadeira (V), uma vez que a história positivista, centrada em documentos oficiais e figuras masculinas, reforçou uma visão excludente que marginalizou as mulheres.

Portanto, a sequência correta é V - F - V, conforme a alternativa B. Esse exercício evidencia como a historiografia contemporânea busca reparar lacunas do passado, destacando a importância de olhares críticos que contestam hierarquias e silêncios históricos.

O texto apresentado aborda a relação entre trabalho e educação, destacando o caráter formativo do trabalho como princípio educativo e sua função humanizadora. Essa perspectiva está alinhada com a visão do materialismo histórico, que compreende o trabalho como a base da produção da vida material e cultural da humanidade.

O materialismo histórico, desenvolvido por Marx e Engels, analisa a sociedade a partir das condições materiais de existência, onde o trabalho é entendido como atividade fundamental que transforma a natureza e, ao mesmo tempo, transforma o próprio ser humano. Nessa abordagem, o trabalho não se limita à esfera econômica, mas engloba a produção de conhecimentos, valores culturais e relações sociais.

As demais alternativas não correspondem adequadamente ao enfoque teórico apresentado no texto. O construtivismo (A) focaliza processos de aprendizagem individual, o existencialismo (B) prioriza a experiência subjetiva, o neoliberalismo (D) trata de políticas econômicas, e o comunismo (E), embora relacionado, refere-se mais a um sistema político-econômico do que a uma teoria sobre o trabalho como princípio educativo.

Portanto, a alternativa correta é efetivamente a C) Materialismo histórico, por ser a corrente teórica que melhor explica o trabalho como atividade produtora da vida material e cultural, conforme descrito no texto.

O movimento dos Annales, como destacado por Ciro Cardoso, representou uma revolução na historiografia ao propor uma nova abordagem metodológica para o estudo da história. Entre as concepções fundamentais compartilhadas por esse grupo, a mais significativa foi a transição da "história-narração" para a "história-problema". Essa mudança implicou abandonar a mera descrição cronológica de eventos em favor de uma análise crítica, baseada na formulação de questões e na investigação das estruturas sociais, econômicas e culturais que moldam os processos históricos.

A alternativa correta, portanto, é a D), pois reflete justamente essa inovação metodológica introduzida pelos Annales. Ao contrário das narrativas tradicionais, que priorizavam eventos políticos e individuais, a "história-problema" buscou compreender as dinâmicas profundas e as interconexões entre diferentes dimensões da vida social. Essa abordagem permitiu uma visão mais complexa e científica do passado, consolidando a história como disciplina autônoma e crítica.

No trecho apresentado, Jacques Le Goff critica uma abordagem historiográfica tradicional que privilegia eventos políticos e militares, como batalhas, congressos diplomáticos e debates parlamentares, em detrimento de aspectos do cotidiano e da vida comum. O autor defende que temas aparentemente banais, como o uso do garfo, os hábitos de higiene ou as práticas amorosas, também possuem relevância histórica e merecem ser estudados com a mesma seriedade.

A crítica de Le Goff está direcionada especificamente à concepção positivista (alternativa C) da história, que predominou no século XIX e enfatizava fatos políticos, grandes personalidades e documentos oficiais como únicos objetos válidos do conhecimento histórico. Essa visão, que o autor deseja ver ultrapassada, menosprezava a análise de práticas sociais, cultura material e comportamentos do dia a dia.

Ao contrário do que poderia sugerir uma leitura superficial, Le Goff não critica a abordagem do cotidiano (alternativa D) - pelo contrário, ele a valoriza. Também não se refere a concepções mitológicas (A) ou materialistas (B), mas sim a uma historiografia positivista que reduzia a história ao estudo formal de eventos políticos e institucionais.

O historiador britânico Eric Hobsbawm é uma das figuras mais influentes no campo da historiografia contemporânea. Sua obra, fundamentada no materialismo histórico, oferece uma análise profunda e crítica dos séculos XIX e XX, marcados por transformações sociais, políticas e econômicas radicais. Hobsbawm destacou-se por sua capacidade de interpretar esses períodos através de uma perspectiva que integrava teoria e prática, tornando seus trabalhos referenciais para a compreensão da modernidade.

Entre suas contribuições mais notáveis estão a tetralogia sobre a era das revoluções, que abrange desde a Revolução Francesa até a queda do socialismo no século XX. Essa abordagem ampla e interdisciplinar permitiu que ele explorasse não apenas os eventos em si, mas também suas causas estruturais e consequências de longo prazo. Dessa forma, Hobsbawm consolidou-se como um pensador essencial para quem deseja entender as dinâmicas do mundo contemporâneo.

Portanto, a afirmação de que Eric Hobsbawm encontrou no materialismo histórico o suporte teórico-metodológico para sua obra e que se notabilizou por livros fundamentais sobre os séculos XIX e XX está correta. Seu legado permanece como um pilar para os estudos históricos, confirmando a alternativa C) CERTO como a resposta adequada.

O grande medievalista francês Marc Bloch, autor do clássico Apologia da História ou o ofício do historiador, inaugurou a concepção de "história como problema", em oposição a uma historiografia positivista que se apoiava em fatos, datas, grandes nomes e heróis. Com Lucien Febvre, ele foi um dos criadores da moderna historiografia conhecida como Escola dos Anais (Annales).

Relativamente às transformações pelas quais passou a produção e a escrita do conhecimento histórico a partir das primeiras décadas do século XX, julgue o item seguinte.

É provável que as circunstâncias que envolvem a civilização contemporânea expliquem o fato de que, na atualidade, historiadores sejam chamados, crescentemente, a atuar nos mais diversos meios de comunicação social, como rádio, televisão, jornais e revistas.

• C) CERTO
• E) ERRADO

O gabarito correto é C).

O item em questão afirma que uma característica marcante da nova história, influenciada pela Escola dos Anais, foi o radical afastamento da história em relação às demais ciências humanas e sociais. Essa afirmação está incorreta, conforme indicado pelo gabarito (E) ERRADO. A Escola dos Anais, liderada por Marc Bloch e Lucien Febvre, promoveu exatamente o oposto: uma abordagem interdisciplinar, integrando a história com outras áreas do conhecimento, como geografia, sociologia, antropologia e economia. A proposta era superar o isolamento da história tradicional, ampliando seu diálogo com as ciências humanas e sociais para enriquecer a análise dos fenômenos históricos.

A nova história, inspirada nos Annales, valorizou temas como mentalidades, cotidiano e estruturas de longa duração, exigindo ferramentas teóricas e metodológicas de outras disciplinas. Portanto, longe de se afastar, a historiografia moderna aproximou-se das ciências humanas, rejeitando o positivismo e abraçando a complexidade da experiência humana no tempo. A resposta correta é, de fato, ERRADO.