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                Aos principais da Bahia chamados os Caramurus                              Há coisa como ver um Paiaiá1                              Mui prezado de ser Caramuru,                              Descendente do sangue tatu,                              Cujo torpe idioma é Cobepá2?                              A linha feminina é Carimá3                              Muqueca, pititinga4, caruru,                              Mingau de puba, vinho de caju                              Pisado num pilão de Pirajá.                              A masculina é um Aricobé5,                             Cuja filha Cobé6, c’um branco Pai                             Dormiu no promontório de Passé.                             O branco é um Marau que veio aqui:                             Ela é uma índia de Maré;                            Cobepá, Aricobé, Cobé, Pai. (MATOS, Gregório. Poemas escolhidos. Seleção, introdução e notas de José Miguel Wisnik. São Paulo: Cultrix, 1976, p. 100) Vocabulário: 1 Paiaiá − Pajé. 2 Cobepá − dialeto da tribo cobé, que habitava as cercanias da cidade. 3 Carimá − bolo feito de mandioca-puba, posta de molho, utilizada para mingau. 4 Pititinga − espécie de peixes pequeninos. 5 Aricobé − cobé (nome de uma tribo de índios progenitores do Paiaiá, a que se refere o poeta). 6 Cobé − palavra que Gregório empregava para designar os descendentes dos indígenas, pois no seu tempo o termo tupi não estava generalizado. (Referência do vocabulário: SANTOS, Luzia Aparecida Oliva dos. O percurso da indianidade na literatura brasileira: matizes da figuração. São Paulo: Cultura Acadêmica, 2009, p. 303) Considere o soneto para analisar as afirmativas abaixo. I. O soneto possui características marcantes no uso dos termos da língua indígena: de um lado, a inserção do léxico tupi metaforiza uma linha constitutiva da cultura brasileira resgatando a presença do índio; de outro, o eixo alto versus baixo, que desmascara a figura do caramuru, mestiço. II. O soneto obedece ao molde europeu no tocante à forma, mas amplia sua configuração ao inserir o universo linguístico pertencente ao nativo. Com esse recurso, o efeito do poema tira as amarras da seriedade para estabelecer o vinco principal da satírica gregoriana no que lhe compete a agressão às instituições e seus representantes pelo viés lúdico, trocando a convenção pela contestação. III. As expressões “Descendente do sangue tatu (v.3)” e “Cujo torpe idioma é cobepá? (v.4)” assumem a duplicidade de função em seu significado por estarem indissoluvelmente ligadas aos elementos caracterizadores de ambas as culturas: o fidalgo possui “sangue de tatu” e seu idioma é “torpe”, “cobepá”. IV. O último verso revela que a verdadeira origem dos principais da Bahia está na nobreza de sangue azul dos europeus. Como se pode notar, o nome Paiaiá, representante nato do sangue indígena, não é colocado entre os que nomeiam simbolicamente os descendentes. Está correto o que se afirma APENAS em

                Aos principais da Bahia chamados os Caramurus

                             Há coisa como ver um Paiaiá1

                             Mui prezado de ser Caramuru,

                             Descendente do sangue tatu,

                             Cujo torpe idioma é Cobepá2?



                             A linha feminina é Carimá3

                             Muqueca, pititinga4, caruru,

                             Mingau de puba, vinho de caju

                             Pisado num pilão de Pirajá.


                             A masculina é um Aricobé5,

                            Cuja filha Cobé6, c’um branco Pai

                            Dormiu no promontório de Passé.


                            O branco é um Marau que veio aqui:

                            Ela é uma índia de Maré;

                            Cobepá, Aricobé, Cobé, Pai.

(MATOS, Gregório. Poemas escolhidos. Seleção, introdução e notas de José Miguel Wisnik.
São Paulo: Cultrix, 1976, p. 100) 


Vocabulário:

1 Paiaiá − Pajé.

2 Cobepá − dialeto da tribo cobé, que habitava as cercanias da cidade.

3 Carimá − bolo feito de mandioca-puba, posta de molho, utilizada para mingau.

4 Pititinga − espécie de peixes pequeninos.

5 Aricobé − cobé (nome de uma tribo de índios progenitores do Paiaiá, a que se refere o poeta).

6 Cobé − palavra que Gregório empregava para designar os descendentes dos indígenas, pois no seu tempo o termo tupi não estava
generalizado.

(Referência do vocabulário: SANTOS, Luzia Aparecida Oliva dos. O percurso da indianidade
na literatura brasileira
: matizes da figuração. São Paulo: Cultura Acadêmica, 2009, p. 303) 

Considere o soneto para analisar as afirmativas abaixo.

I. O soneto possui características marcantes no uso dos termos da língua indígena: de um lado, a inserção do léxico tupi
metaforiza uma linha constitutiva da cultura brasileira resgatando a presença do índio; de outro, o eixo alto versus baixo,
que desmascara a figura do caramuru, mestiço.

II. O soneto obedece ao molde europeu no tocante à forma, mas amplia sua configuração ao inserir o universo linguístico
pertencente ao nativo. Com esse recurso, o efeito do poema tira as amarras da seriedade para estabelecer o vinco
principal da satírica gregoriana no que lhe compete a agressão às instituições e seus representantes pelo viés lúdico,
trocando a convenção pela contestação.

III. As expressões “Descendente do sangue tatu (v.3)” e “Cujo torpe idioma é cobepá? (v.4)” assumem a duplicidade de
função em seu significado por estarem indissoluvelmente ligadas aos elementos caracterizadores de ambas as culturas: o
fidalgo possui “sangue de tatu” e seu idioma é “torpe”, “cobepá”.

IV. O último verso revela que a verdadeira origem dos principais da Bahia está na nobreza de sangue azul dos europeus.
Como se pode notar, o nome Paiaiá, representante nato do sangue indígena, não é colocado entre os que nomeiam
simbolicamente os descendentes.

Está correto o que se afirma APENAS em

Resposta:

A alternativa correta é D)

O soneto de Gregório de Matos, intitulado "Aos principais da Bahia chamados os Caramurus", apresenta uma rica mistura de elementos linguísticos e culturais, explorando tanto a forma clássica europeia quanto o léxico indígena. A análise das afirmativas revela que apenas as proposições I, II e III estão corretas, conforme o gabarito D.

A afirmativa I destaca a presença marcante do léxico tupi no poema, que metaforiza a formação cultural brasileira ao mesmo tempo que critica a figura do caramuru, mestiço que ascende socialmente. Essa dualidade entre o "alto" e o "baixo" é uma característica da sátira gregoriana, que desmascara as pretensões de nobreza dos principais da Bahia.

A afirmativa II ressalta a estrutura formal do soneto, que segue o modelo europeu, mas subverte suas convenções ao incorporar termos indígenas e um tom satírico. Gregório de Matos utiliza o lúdico e a ironia para contestar as instituições e seus representantes, criando um efeito poético que mistura crítica social e humor.

A afirmativa III aponta para a duplicidade de significados em expressões como "sangue tatu" e "idioma cobepá", que vinculam a figura do fidalgo tanto à cultura europeia quanto à indígena. Essa ambiguidade reforça a crítica à mestiçagem e às pretensões de nobreza dos caramurus.

Já a afirmativa IV está incorreta, pois o último verso não afirma a origem europeia dos principais da Bahia, mas sim evidencia a mistura de culturas, representada pelos nomes indígenas (Cobepá, Aricobé, Cobé) e pelo termo "Pai", que pode remeter ao colonizador. Além disso, o nome Paiaiá, embora não apareça no último verso, está presente no poema como referência ao pajé, figura central da cultura indígena.

Portanto, a análise correta do soneto está expressa nas afirmativas I, II e III, que capturam a essência da crítica social e da fusão cultural presente na obra de Gregório de Matos.

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