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Questões Sobre Modernismo - Literatura - concurso

Questão 1

Texto 1

                     Carta ao leitor – Uma falsa solução mágica

      O perigo de políticas públicas desgastadas, que custam caro e dão pouco resultado, serem substituídas por outras ainda piores é sempre muito alto quando não há bons exemplos para emular. A legalização da maconha é uma dessas soluções aparentemente simples para um problema complexo que muitos estudiosos e políticos sérios, e outros nem tanto, defendem na falta de uma ideia melhor. A premissa, nunca testada na prática em sua totalidade, é que a liberação da produção, da venda e do consumo da Cannabis seria suficiente para eliminar do problema sua porção mais danosa, a cadeia de crimes alimentada pelo dinheiro do tráfico. Pois os eleitores do Uruguai e do Colorado e de Washington, nos Estados Unidos, decidiram, pelo voto direto ou de seus representantes, ser cobaias da experiência de legalizar a maconha. Dentro de alguns meses, qualquer cidadão adulto do nosso país vizinho e dos dois estados americanos poderá comprar a droga numa farmácia ou loja especializada.

      VEJA destacou duas repórteres para ver de perto o impacto que a legalização da maconha está tendo entre os uruguaios e os americanos. Sim, porque, mesmo antes da entrada em vigor das leis, seu espírito liberalizante já se instalou. As jornalistas viram uma realidade menos rósea que aquela com que os defensores da medida costumam sonhar. Uma das repórteres visitou seis cidades em Washington, no Colorado e na Califórnia, onde, a exemplo de outros dezessete estados e da capital americana, a maconha é de quase livre acesso, mesmo que, teoricamente, só possa ser vendida por prescrição médica.

      Da mesma forma que ocorre com as bebidas alcoólicas, há sempre algum adulto irresponsável disposto a comprar maconha para um adolescente usar. “Preparando‐se para a entrada em vigor da nova lei, as lojas vão vender maconha muito mais potente do que a dos traficantes”, diz a repórter. Nossa segunda repórter teve uma impressão ainda mais negativa do caso uruguaio. Enquanto nos estados americanos existe uma provisão para avaliar de tempos em tempos o acerto da legalização, no Uruguai predomina a improvisação: “Ninguém analisou em profundidade as consequências de longo prazo que a legalização pode trazer”.                        

                                                                                                  (Veja, 13/11/2013)

Um editor de texto deve ter domínio da norma culta da língua e
das progressivas alterações que essa língua vem sofrendo. No
livro A língua portuguesa e o modernismo, o autor fala de
algumas modificações na norma culta que o Modernismo
introduziu ou vem introduzindo.

Assinale a alternativa em que a frase dada não confirma a
modificação indicada no início.

  • A)início de frase com pronome oblíquo átono / Me encontraram no meio da mata, completamente perdido.
  • B)troca do verbo haver (= existir) pelo verbo ter / Eles ainda não tinham chegado ao resultado do problema.
  • C)má colocação de pronome oblíquo entre dois verbos / Ela soube se retirar no momento preciso.
  • D)emprego do pronome ele/ela como objeto direto / Encontrou ele em pleno centro da cidade.
  • E)emprego do verbo implicar fora de sua regência original / Os resultados implicaram em grande problema para todos.
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A alternativa correta é B)

O debate sobre a legalização da maconha é um tema complexo e polarizado, como demonstra a análise apresentada na revista Veja em 2013. O texto aborda as experiências do Uruguai e de alguns estados americanos, como Colorado e Washington, que optaram por legalizar a droga como forma de combater o tráfico e seus efeitos violentos. No entanto, os relatos das repórteres sugerem que a realidade pode ser menos promissora do que os defensores da medida imaginam.

A reportagem destaca preocupações como o aumento da potência da maconha comercializada legalmente e a falta de estudos aprofundados sobre as consequências de longo prazo, especialmente no Uruguai, onde a implementação parece mais improvisada. Esses pontos questionam a ideia de que a legalização seria uma "solução mágica" para um problema multifacetado como o das drogas.

Paralelamente, o texto sobre o editor de língua portuguesa reforça a importância de dominar a norma culta e suas transformações, como as influências do Modernismo. O exercício proposto testa o conhecimento sobre essas mudanças, sendo a alternativa B) a correta, pois não exemplifica a troca de "haver" por "ter" no sentido de existir, mas sim o uso de "ter" como auxiliar.

Ambos os textos, embora tratem de assuntos distintos, enfatizam a necessidade de análise crítica e aprofundada antes de adotar medidas que podem ter impactos significativos, seja na política de drogas ou na evolução linguística.

Questão 2

                     Poema tirado de uma notícia de jornal

         João Gostoso era carregador de feira livre e morava no morro da

                                                     [Babilônia num barracão sem número.

         Uma noite ele chegou no bar Vinte de Novembro

         Bebeu

         Cantou

         Dançou

         Depois se atirou na Lagoa Rodrigo de Freitas e morreu afogado.

                                                            Manuel Bandeira. Libertinagem.  

Considere as seguintes afirmações:

A filiação do poema à estética do Modernismo revela-se na

I escolha de assunto pertencente à esfera do cotidiano humilde e prosaico, em
oposição ao Parnasianismo antecendente, que cultivava os temas ditos nobres,
solenes e elevados.

II utilização de objeto ou texto já pronto ou constituído, alegadamente
encontrado na realidade exterior, como base da composição poética.

III ruptura das fronteiras entre os gêneros literários tradicionais, que aparecem
mesclados no texto.

Está correto o que se afirma em

  • A)I, somente.
  • B)I e II, somente.
  • C)II e III, somente.
  • D)I e III, somente.
  • E)I, II e III.
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A alternativa correta é E)

O poema "Poema tirado de uma notícia de jornal", de Manuel Bandeira, exemplifica características marcantes da estética modernista, conforme demonstrado nas afirmações I, II e III.

A primeira afirmação (I) destaca a escolha de um assunto cotidiano e humilde, contrastando com a temática nobre do Parnasianismo. O poema retrata a vida simples de João Gostoso, um carregador de feira livre, e sua morte trágica, afastando-se dos ideais de grandiosidade literária anteriores.

A segunda afirmação (II) aponta para a técnica modernista de utilizar elementos da realidade como matéria-prima poética. O título do poema já sugere essa apropriação, indicando que a obra foi construída a partir de uma notícia jornalística, um recurso típico da colagem modernista.

Por fim, a terceira afirmação (III) refere-se à mescla de gêneros, outra característica modernista. O texto apresenta elementos narrativos (contando uma história) e líricos (na construção poética), rompendo com as divisões tradicionais entre gêneros literários.

Portanto, todas as afirmações estão corretas, sendo o gabarito E) I, II e III.

Questão 3

                     Poema tirado de uma notícia de jornal

         João Gostoso era carregador de feira livre e morava no morro da

                                                     [Babilônia num barracão sem número.

         Uma noite ele chegou no bar Vinte de Novembro

         Bebeu

         Cantou

         Dançou

         Depois se atirou na Lagoa Rodrigo de Freitas e morreu afogado.

                                                            Manuel Bandeira. Libertinagem.  

NÃO se encontra, entre os aspectos que contribuem para o efeito poético do
texto,

  • A)a concentração dos recursos expressivos nele empregados.
  • B)a presença de marcas da variedade linguística de caráter popular e coloquial.
  • C)a apresentação, sem comentários ou explicações, das ações de “João Gostoso”.
  • D)o tratamento satírico dado à personagem “João Gostoso”.
  • E)o contraste entre a relativa informalidade das referências concernentes a “João Gostoso” e a designação precisa dos demais locais públicos citados.
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A alternativa correta é D)

O poema "Poema tirado de uma notícia de jornal", de Manuel Bandeira, presente em Libertinagem, é um exemplo marcante da capacidade de transformar o cotidiano em arte. A partir de uma notícia banal, o poeta constrói uma narrativa concisa e carregada de significado, explorando a vida e a morte de João Gostoso, um carregador de feira livre.

O texto se destaca pela economia de palavras e pela ausência de julgamentos, apresentando os fatos de forma direta e objetiva. A linguagem coloquial e popular, como em "barracão sem número" e "bebeu / cantou / dançou", aproxima o leitor da realidade simples do protagonista. Além disso, o contraste entre a informalidade das referências a João Gostoso e a precisão dos locais públicos citados (como o bar Vinte de Novembro e a Lagoa Rodrigo de Freitas) reforça a dicotomia entre o indivíduo e o espaço urbano.

No entanto, o que não contribui para o efeito poético do texto é o tratamento satírico da personagem. O poema não ridiculariza João Gostoso, mas o retrata com certa neutralidade e até com uma pitada de lirismo, apesar da crueza dos acontecimentos. A ausência de ironia ou deboche é evidente, o que torna a alternativa D) a correta, já que a satira não está presente na construção do poema.

Assim, Bandeira demonstra sua maestria ao extrair poesia do trivial, utilizando recursos como concisão, coloquialismo e contrastes, mas sem recorrer ao humor ou à crítica mordaz em relação à sua personagem principal.

Questão 4

Leia os versos de Ricardo Reis, heterônimo de Fernando
Pessoa.

Quando, Lídia, vier o nosso Outono


Com o Inverno que há nele, reservemos

Um pensamento, não para a futura

Primavera, que é de outrem,

Nem para o estio, de quem somos mortos,

Senão para o que fica do que passa –

O amarelo atual que as folhas vivem

E as torna diferentes.

Nesses versos, as estações do ano constituem metáforas pelas
quais o eu lírico

  • A)analisa o que viveu e lamenta que, então na velhice, não possa aproveitar a vida como na juventude.
  • B)lamenta a inevitável chegada da velhice, sugerindo que preferia estar ainda vivendo a juventude.
  • C)se mostra amedrontado com a iminente chegada da velhice que virá acompanhada pela morte.
  • D)revela viver intensamente o presente, sem mostrar preocupações com a inexorabilidade da morte.
  • E)reconhece a fugacidade do tempo, deixando implícita a necessidade de se aproveitar o momento presente.
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A alternativa correta é E)

Os versos de Ricardo Reis, heterônimo de Fernando Pessoa, apresentam uma reflexão lírica sobre a passagem do tempo e a aceitação das diferentes fases da vida. Através da metáfora das estações, o eu lírico estabelece um diálogo com Lídia, convidando-a a viver plenamente o presente, representado pelo "amarelo atual" das folhas, sem se prender ao passado ou se preocupar excessivamente com o futuro.

A análise correta da postura do eu lírico está na alternativa E, que identifica no poema o reconhecimento da fugacidade temporal e a valorização do momento presente. Ao mencionar "o que fica do que passa", o poeta não demonstra medo da velhice (representada pelo Outono e Inverno), nem lamenta a perda da juventude (Primavera e estio), mas sim propõe uma sabedoria estoica de aceitação do ciclo natural da existência.

A essência do poema reside precisamente nessa percepção de que cada fase da vida possui sua beleza singular - representada pela diferença das folhas amarelas do Outono. O eu lírico não se mostra nem nostálgico pelo passado (alternativas A e B), nem temeroso do futuro (alternativa C), mas sim consciente da importância de viver intensamente o agora (alternativa D capta parte dessa ideia, mas a alternativa E expressa mais completamente a mensagem do poema ao incluir a noção de transitoriedade).

A filosofia presente nos versos reflete características marcantes da poesia de Ricardo Reis: o estoicismo, o epicurismo moderado e a valorização do carpe diem, onde a sabedoria consiste em aceitar o fluxo do tempo sem angústia, extraindo a beleza peculiar de cada momento efêmero da existência.

Questão 5

Antiode

Poesia, não será esse

o sentido em que

ainda te escrevo:

flor! (Te escrevo:

flor! Não uma

flor, nem aquela

flor-virtude — em

disfarçados urinóis).

Flor é a palavra

flor; verso inscrito

no verso, como as

manhãs no tempo.

Flor é o salto

da ave para o voo:

o salto fora do sono

quando seu tecido

se rompe; é uma explosão

posta a funcionar,

como uma máquina,

uma jarra de flores.

MELO NETO, J. C. Psicologia da composição. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 1997 (fragmento)

A poesia é marcada pela recriação do objeto por
meio da linguagem, sem necessariamente explicá-lo.
Nesse fragmento de João Cabral de Melo Neto, poeta
da geração de 1945, o sujeito lírico propõe a recriação
poética de

  • A)uma palavra, a partir de imagens com as quais ela pode ser comparada, a fim de assumir novos significados.
  • B)um urinol, em referência às artes visuais ligadas às vanguardas do início do século XX.
  • C)uma ave, que compõe, com seus movimentos, uma imagem historicamente ligada à palavra poética.
  • D)uma máquina, levando em consideração a relevância do discurso técnico-científico pós-Revolução Industrial.
  • E)um tecido, visto que sua composição depende de elementos intrínsecos ao eu lírico.
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A alternativa correta é A)

O fragmento poético de João Cabral de Melo Neto, presente em Psicologia da composição, revela uma reflexão metalinguística sobre a própria natureza da poesia. O sujeito lírico não se contenta em simplesmente nomear ou descrever um objeto, mas busca recriá-lo através da linguagem, conferindo-lhe novos significados e dimensões simbólicas.

No poema, a palavra "flor" é desconstruída e reinventada por meio de uma série de imagens poéticas que ampliam seu sentido. O poeta não se refere a uma flor concreta, nem a um símbolo convencional ("flor-virtude"), mas à própria palavra enquanto elemento poético. Essa abordagem é exemplificada em versos como "Flor é a palavra / flor; verso inscrito / no verso", onde a linguagem se torna o próprio objeto de investigação.

A alternativa correta (A) aponta justamente para esse processo de ressignificação da palavra através de comparações inusitadas. A flor é associada a imagens diversas: desde "manhãs no tempo" até "o salto da ave para o voo" e "uma explosão / posta a funcionar". Essas metáforas não pretendem explicar o conceito de flor, mas sim expandir suas possibilidades semânticas no âmbito poético.

João Cabral, característico de sua geração de 1945, demonstra aqui sua preocupação com a construção poética consciente, onde a palavra não é mero veículo de significado, mas matéria-prima a ser trabalhada. O poema funciona como uma antiode (como sugere o título), ou seja, uma ode que em vez de celebrar um objeto convencional, celebra a própria linguagem e seu poder criador.

Questão 6

                                        A partida de trem

      Marcava seis horas da manhã. Angela Pralini pagou
o táxi e pegou sua pequena valise. Dona Maria Rita de
Alvarenga Chagas Souza Melo desceu do Opala da
filha e encaminharam-se para os trilhos. A velha bem-vestida
e com joias. Das rugas que a disfarçavam saía
a forma pura de um nariz perdido na idade, e de uma
boca que outrora devia ter sido cheia e sensível. Mas
que importa? Chega-se a um certo ponto — e o que foi
não importa. Começa uma nova raça. Uma velha não
pode comunicar-se. Recebeu o beijo gelado de sua filha
que foi embora antes do trem partir. Ajudara-a antes a
subir no vagão. Sem que neste houvesse um centro, ela
se colocara do lado. Quando a locomotiva se pôs em
movimento, surpreendeu-se um pouco: não esperava
que o trem seguisse nessa direção e sentara-se de
costas para o caminho.

      Angela Pralini percebeu-lhe o movimento e perguntou:

      — A senhora deseja trocar de lugar comigo?

      Dona Maria Rita se espantou com a delicadeza,
disse que não, obrigada, para ela dava no mesmo.
Mas parecia ter-se perturbado. Passou a mão sobre o camafeu filigranado de ouro, espetado no peito, passou
a mão pelo broche. Seca. Ofendida? Perguntou afinal a
Angela Pralini:

      — É por causa de mim que a senhorita deseja trocar
de lugar?

LISPECTOR, C. Onde estivestes de noite. Rio de Janeiro:
Nova Fronteira, 1980 (fragmento)

A descoberta de experiências emocionais com base
no cotidiano é recorrente na obra de Clarice Lispector.
No fragmento, o narrador enfatiza o(a)

  • A)comportamento vaidoso de mulheres de condição social privilegiada.
  • B)anulação das diferenças sociais no espaço público de uma estação.
  • C)incompatibilidade psicológica entre mulheres de gerações diferentes.
  • D)constrangimento da aproximação formal de pessoas desconhecidas.
  • E)sentimento de solidão alimentado pelo processo de envelhecimento.
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A alternativa correta é E)

A solidão no envelhecimento: uma análise do fragmento de Clarice Lispector

No trecho de "Onde estivestes de noite", Clarice Lispector explora com maestria a temática da solidão no processo de envelhecimento, revelando como essa condição humana pode ser intensificada pela passagem do tempo. A personagem Dona Maria Rita, descrita como "uma velha bem-vestida e com joias", carrega consigo não apenas as marcas físicas da idade, mas principalmente o peso emocional de quem se sente isolada em seu próprio mundo.

A autora constrói a cena com elementos simbólicos que reforçam essa interpretação. O "beijo gelado" da filha, que parte antes mesmo do trem sair, sugere uma relação familiar esvaziada de afeto genuíno. A escolha inconsciente de se sentar de costas para o caminho que o trem seguirá pode ser lida como metáfora de como a personagem vive em descompasso com o fluxo da vida. A passagem "Chega-se a um certo ponto — e o que foi não importa" revela a resignação de quem se sente desconectada até de seu próprio passado.

A interação com Angela Pralini acentua esse sentimento de isolamento. A perturbação de Dona Maria Rita diante de um simples gesto de gentileza ("se espantou com a delicadeza") mostra o quanto ela está habituada à indiferença. Seu movimento repetitivo de passar a mão no broche sugere um comportamento ansioso, talvez buscando conforto em objetos que, diferentemente das pessoas, permanecem sempre ao seu alcance.

Lispector, com sua prosa introspectiva característica, não apenas descreve uma cena cotidiana, mas revela as camadas emocionais mais profundas da condição humana. Através de Dona Maria Rita, a autora nos apresenta a solidão como companheira inevitável do envelhecimento, especialmente quando este não é acompanhado por vínculos afetivos significativos. A obra nos convida a refletir sobre como nossa sociedade lida com essa fase da vida e como podemos construir relações mais genuínas que transcendam as barreiras do tempo.

Questão 7

Leia o texto a seguir:

COTA ZERO
Carlos Drummond de Andrade
Stop
A Vida parou
ou foi o automóvel?
Podemos afirmar que no texto acima há tudo que se diz abaixo, exceto:

  • A)valorização poética do quotidiano.
  • B)desvalorização irônica da vida.
  • C)sentimento trágico da existência.
  • D)falta de humor, como solução.
  • E)integração poética da civilização material.
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A alternativa correta é D)

O poema "Cota Zero", de Carlos Drummond de Andrade, é um exemplo da habilidade do autor em transformar o cotidiano em reflexão poética. Em poucos versos, Drummond captura um momento aparentemente banal — a parada de um automóvel — e o eleva a uma questão existencial, questionando se foi a vida ou o veículo que parou. Essa abordagem permite múltiplas interpretações, mas uma análise cuidadosa revela que nem todas as alternativas propostas se aplicam ao texto.

A valorização poética do quotidiano (alternativa A) está presente, pois o poeta extrai significado de uma situação trivial. Já a desvalorização irônica da vida (B) pode ser identificada no tom ambíguo do questionamento, que coloca a vida e o automóvel em pé de igualdade. O sentimento trágico da existência (C) também se faz notar na brevidade e na incerteza do verso, que remetem à fragilidade humana. A integração poética da civilização material (E) aparece na fusão entre o elemento tecnológico (o carro) e a reflexão sobre a vida.

Porém, a falta de humor, como solução (D), não se sustenta no texto. Drummond frequentemente emprega ironia e leveza, mesmo em temas profundos, e esse poema não foge à regra. A ambiguidade entre "a Vida parou / ou foi o automóvel?" carrega um traço de humor sutil, desconstruindo a seriedade excessiva. Portanto, a alternativa D é a que não se aplica, confirmando o gabarito correto.

Questão 8

Parte II: Literatura Brasileira 

Texto 1

    Algum tempo hesitei se devia abrir estas
memórias pelo princípio ou pelo fim, isto é, se poria
em primeiro lugar o meu nascimento ou a minha
morte. Suposto o uso vulgar seja começar pelo
nascimento, duas considerações me levaram a
adotar diferente método: a primeira é que eu não
sou propriamente um autor defunto, mas um
defunto autor, para quem a campa foi outro berço; a
segunda é que o escrito ficaria assim mais galante
e mais novo. Moisés, que também contou a sua
morte, não a pôs no introito, mas no cabo: diferença
radical entre este livro e o Pentateuco.

    Dito isto, expirei às duas horas da tarde de
uma sexta-feira do mês de agosto de 1869, na
minha bela chácara de Catumbi. Tinha uns
sessenta e quatro anos, rijos e prósperos, era
solteiro, possuía cerca de trezentos contos e fui
acompanhado ao cemitério por onze amigos. Onze
amigos! Verdade é que não houve cartas nem
anúncios. Acresce que chovia – peneirava – uma
chuvinha miúda, triste e constante, tão constante e
tão triste, que levou um daqueles fiéis da última
hora a intercalar esta engenhosa ideia no discurso
que proferiu à beira de minha cova: – “Vós, que o conhecestes, meus senhores, vós podeis dizer
comigo que a natureza parece estar chorando a
perda irreparável de um dos mais belos caracteres
que têm honrado a humanidade. Este ar sombrio,
estas gotas do céu, aquelas nuvens escuras que
cobrem o azul como um crepe funéreo, tudo isso é
a dor crua e má que lhe rói à natureza as mais
íntimas entranhas; tudo isso é um sublime louvor ao
nosso ilustre finado”.

(ASSIS, Machado de. Memórias póstumas de Brás
Cubas.
Rio de Janeiro: Companhia José Aguilar Editora,
1971, volume I, p. 513-514.)

Texto 2

    Resolvo-me a contar, depois de muita
hesitação, casos passados há dez anos – e, antes
de começar, digo os motivos por que silenciei e por
que me decido. Não conservo notas: algumas que
tomei foram inutilizadas, e assim, com o decorrer do
tempo, ia-me parecendo cada vez mais difícil,
quase impossível, redigir esta narrativa. Além disso,
julgando a matéria superior às minhas forças,
esperei que outros mais aptos se ocupassem dela.
Não vai aqui falsa modéstia, como adiante se verá.
Também me afligiu a ideia de jogar no papel
criaturas vivas, sem disfarces, com os nomes que
têm no registro civil. Repugnava-me deformá-las,
dar-lhes pseudônimo, fazer do livro uma espécie de
romance; mas teria eu o direito de utilizá-las em
história presumivelmente verdadeira? Que diriam
elas se se vissem impressas, realizando atos
esquecidos, repetindo palavras contestáveis e
obliteradas?

    (…) Certos escritores se desculpam de não
haverem forjado coisas excelentes por falta de
liberdade − talvez ingênuo recurso de justificar
inépcia ou preguiça. Liberdade completa ninguém
desfruta: começamos oprimidos pela sintaxe e
acabamos às voltas com a Delegacia de Ordem
Política e Social, mas, nos estreitos limites a que
nos coagem a gramática e a lei, ainda nos podemos
mexer.

(RAMOS, Graciliano. Memórias do cárcere. São Paulo:
Record, 1996, volume I, p. 33-34.)

Situa-se a literatura de Graciliano Ramos na:

  • A)primeira fase do modernismo.
  • B)segunda fase do modernismo.
  • C)terceira fase do modernismo.
  • D)geração de 45.
  • E)pós-modernidade.
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A alternativa correta é B)

Parte II: Literatura Brasileira

Análise Comparativa entre Machado de Assis e Graciliano Ramos

Os textos apresentados, embora distintos em estilo e contexto histórico, revelam aspectos fundamentais da evolução da literatura brasileira. O primeiro excerto, retirado de Memórias Póstumas de Brás Cubas, de Machado de Assis, exemplifica o realismo brasileiro do século XIX, marcado pela ironia, pessimismo e análise psicológica. Já o segundo texto, pertencente a Memórias do Cárcere, de Graciliano Ramos, insere-se na segunda fase do modernismo brasileiro, caracterizada por uma abordagem mais engajada e crítica social.

Graciliano Ramos, como representante da segunda fase modernista (décadas de 1930 e 1940), distancia-se do experimentalismo linguístico da primeira fase e aprofunda-se na denúncia das desigualdades sociais e na exploração da condição humana. Sua prosa seca e objetiva reflete o regionalismo crítico, alinhado a autores como Jorge Amado e Rachel de Queiroz.

Portanto, a obra de Graciliano Ramos situa-se claramente na segunda fase do modernismo, consolidando-se como uma das expressões literárias mais impactantes desse período. Sua escrita, ao mesmo tempo que mantém raízes na tradição realista, incorpora elementos inovadores que refletem as transformações estéticas e ideológicas da literatura brasileira no início do século XX.

Questão 9

Texto 1

1     No Brasil de hoje, talvez no mundo, parece
haver um duplo fenômeno de proliferação dos
poetas e de diminuição da circulação da poesia (por
exemplo, no debate público e no mercado). Uma
das possíveis explicações para isso é a resistência
que a poesia tem de se tornar um produto mercantil,
ou seja, de se tornar objeto da cultura de massas.
Ao mesmo tempo, numa sociedade de consumo e
laica, parece não haver mais uma função social
para o poeta, substituído por outros personagens. A
poesia, compreendida como a arte de criar poemas,
se tornou anacrônica?

2     Parece-me que a poesia escrita sempre será
– pelo menos em tempo previsível – coisa para
poucas pessoas. É que ela exige muito do seu
leitor. Para ser plenamente apreciado, cada poema
deve ser lido lentamente, em voz baixa ou alta, ou
ainda “aural”, como diz o poeta Jacques Roubaud.
Alguns de seus trechos, ou ele inteiro, devem ser
relidos, às vezes mais de uma vez. Há muitas
coisas a serem descobertas num poema, e tudo
nele é sugestivo: os sentidos, as alusões, a
sonoridade, o ritmo, as relações paronomásicas, as
aliterações, as rimas, os assíndetos, as
associações icônicas etc. Todos os componentes
de um poema escrito podem (e devem) ser levados
em conta. Muitos deles são inter-relacionados. Tudo
isso deve ser comparado a outros poemas que o
leitor conheça. E, de preferência, o leitor deve ser
familiarizado com os poemas canônicos. (…) O
leitor deve convocar e deixar que interajam uns com
os outros, até onde não puder mais, todos os
recursos de que dispõe: razão, intelecto,
experiência, cultura, emoção, sensibilidade,
sensualidade, intuição, senso de humor, etc.

3     Sem isso tudo, a leitura do poema não
compensa: é uma chatice. Um quadro pode ser
olhado en passant; um romance, lido à maneira
dinâmica; uma música, ouvida distraidamente; um
filme, uma peça de teatro, um ballet, idem. Um
poema, não. Nada mais entediante do que a leitura
desatenta de um poema. Quanto melhor ele for,
mais faculdades nossas, e em mais alto grau, são
por ele solicitadas e atualizadas. É por isso que
muita gente tem preguiça de ler um poema, e muita
gente jamais o faz. Os que o fazem, porém, sabem
que é precisamente a exigência do poema – a
interação e a atualização das nossas faculdades –
que constitui a recompensa (incomparável) que ele
oferece ao seu leitor. Mas os bons poemas são
raridades. A função do poeta é fazer essas
raridades. Felizmente, elas são anacrônicas, porque
nos fazem experimentar uma temporalidade inteiramente diferente da temporalidade utilitária em
que passamos a maior parte das nossas vidas.

(CÍCERO, Antônio. In: antoniocicero. Hogspot.com.br/
2008_09_01archive.html (adaptado de uma entrevista).

Em vários poemas de Ou isto ou aquilo,
Cecília Meireles obtém efeitos muito “sugestivos”
extraídos de “relações paronomásicas” (§ 2) – o que
se observa, por exemplo, nos seguintes versos:

  • A)“Ou se tem chuva e não se tem sol / ou se tem sol e não se tem chuva!”
  • B)“Com seu colar de coral / Carolina / corre por entre as colunas / da colina.”
  • C)“No último andar é mais bonito: do último andar se vê o mar. / É lá que eu quero morar.”
  • D)“Arabela / abria a janela. / Carolina / erguia a cortina. / E Maria / olhava e sorria: / „Bom dia!‟”
  • E)“Esta menina / tão pequenina / quer ser bailarina.”
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A alternativa correta é B)

A Poesia como Resistência ao Utilitarismo

O texto de Antônio Cícero apresenta uma reflexão profunda sobre o lugar da poesia na sociedade contemporânea, marcada pelo consumo e pela cultura de massas. A poesia, como arte que exige um engajamento singular do leitor, parece ocupar um espaço cada vez mais restrito, quase anacrônico, diante da velocidade e do pragmatismo que caracterizam a vida moderna. No entanto, é justamente essa resistência em se tornar um produto mercantil que revela a força e a singularidade da poesia.

Cícero destaca que a poesia escrita demanda uma leitura atenta, minuciosa, capaz de explorar suas múltiplas camadas de sentido. Ao contrário de outras formas de arte, que podem ser apreciadas de maneira mais superficial, o poema exige uma imersão total do leitor, convocando suas faculdades intelectuais, emocionais e sensoriais. Essa exigência, por um lado, afasta muitos leitores, mas, por outro, oferece uma recompensa única: a experiência de uma temporalidade distinta, que rompe com a lógica utilitária do cotidiano.

O exemplo de Cecília Meireles em Ou isto ou aquilo ilustra como a poesia pode criar efeitos sugestivos por meio de recursos como as relações paronomásicas, como no verso "Com seu colar de coral / Carolina / corre por entre as colunas / da colina". A sonoridade e a repetição de fonemas constroem um ritmo e uma musicalidade que transcendem o significado literal das palavras, convidando o leitor a uma experiência sensorial e lúdica.

Assim, a poesia, longe de ser um artefato obsoleto, mantém sua relevância como espaço de resistência e transcendência. Ela desafia a lógica do consumo imediato e oferece uma alternativa à temporalidade acelerada da vida moderna. Os bons poemas, como raridades que são, nos permitem experimentar uma dimensão do tempo e da existência que o utilitarismo não consegue capturar. Nesse sentido, a poesia não só sobrevive, mas se afirma como uma forma de arte essencial, capaz de nos conectar com o que há de mais profundo e humano em nós.

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Questão 10

Leia o poema de Carlos Drummond de Andrade.


Toada do Amor


E o amor sempre nessa toada:

briga perdoa perdoa briga.


Não se deve xingar a vida,

a gente vive, depois esquece.

Só o amor volta para brigar,

para perdoar,

amor cachorro bandido trem.


Mas, se não fosse ele, também

que graça que a vida tinha?


Mariquita, dá cá o pito,

no teu pito está o infinito.


(Carlos Drummond de Andrade, Alguma poesia.
In: Poesia 1930-1962.

Em harmonia com a estética do modernismo brasileiro,
observa-se, no poema, o uso

  • A)da métrica regular e a preferência por rimas internas.
  • B)de um ritmo intenso, que aproxima a poesia da música.
  • C)de uma linguagem coloquial e a irreverência ao tratar do amor
  • D)de metáforas obscuras, distanciando a poesia da linguagem cotidiana.
  • E)da pergunta retórica, revelando um discurso marcadamente intimista.
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A alternativa correta é C)

Em seu poema "Toada do Amor", Carlos Drummond de Andrade apresenta características marcantes do modernismo brasileiro, movimento do qual foi um dos principais expoentes. A análise do texto revela uma abordagem singular do tema amoroso, distanciando-se das convenções poéticas tradicionais.

A opção correta, C, aponta para dois elementos fundamentais da obra drummondiana e do modernismo: o uso da linguagem coloquial e o tratamento irreverente do amor. Essas características são evidentes no poema através de expressões como "amor cachorro bandido trem" e na estrutura que alterna brigas e perdões, apresentando o amor como uma experiência dinâmica e contraditória, longe dos ideais românticos.

A linguagem cotidiana se manifesta no vocabulário simples e nas construções frasais próximas da fala espontânea, como em "a gente vive, depois esquece". Já a irreverência aparece na comparação do amor com elementos prosaicos (cachorro, trem) e na brincadeira final com Mariquita e seu pito, que subverte expectativas ao associar o infinito a um objeto trivial.

Essa abordagem inovadora reflete a busca modernista por uma poesia mais conectada com a realidade brasileira e menos presa às formalidades clássicas, mantendo, no entanto, profundidade na exploração de temas universais como o amor e a existência humana.

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