Questões Sobre Realismo - Literatura - concurso
Questão 51
Não posso dizer positivamente em que ano nasceu a crônica; mas há toda a probabilidade de crer que foi coletânea das primeiras duas vizinhas. Essas vizinhas, entre o jantar e a merenda, sentaram-se à porta, para debicar os sucessos do dia.
Provavelmente começaram a lastimar-se do calor. Um dia que não pudera comer ao jantar, outra que tinha a camisa mais ensopando que as ervas que comera. Passar das ervas às plantações do morador fronteiro, e logo às tropelias amatórias do dito morador, e ao resto, era a coisa mais fácil, natural e possível do mundo. Eis a origem da crônica
(ASSIS, Machado de. As Cem Melhores Crônicas Brasileiras. Objetiva Rio de Janeiro, 2007, p. 27).
Ao final, Machado de Assis diz: “Eis a origem da crônica”. Essa forma de desfecho:
- A)não pode ser vista como conclusão de um parecer acerca da crônica. Como se sabe, ele não trabalha os detalhes que dão suporte à premissa inicial no decorrer do texto.
- B)é uma estratégia estilística, inerente aos efeitos estéticos do texto literário, pois, considerando a estrutura argumentativa, esse texto de Machado de Assis desconsidera os elementos da dissertação. Então, a frase em destaque é apenas um adendo ao conjunto da reflexão machadiana.
- C)contém uma inadequação sintática: Machado de Assis não deveria ter concluído o texto com uma oração deslocada do contexto, pois aí é trabalhada uma sequência de fatos que exige destrinchar de orações.
- D)convém às formas figuradas de expressão, às conotações, às entrelinhas, às montagens sintáticas indiretas e deslineares.
- E)contempla a sequência do pensamento do autor a respeito do gênero cronístico: há uma problemática que diz respeito ao nascimento da crônica; depois, fatos que a compõem, elementos envolvidos e o fechamento.
A alternativa correta é E)
O trecho de Machado de Assis sobre a origem da crônica apresenta uma estrutura narrativa que culmina na afirmação "Eis a origem da crônica". Essa frase final não é apenas um fechamento abrupto, mas sim a conclusão lógica de um raciocínio desenvolvido ao longo do texto.
Inicialmente, o autor levanta uma questão sobre o nascimento do gênero, sugerindo sua origem nas conversas cotidianas entre vizinhas. Em seguida, descreve o processo natural pelo qual esses diálogos banais se transformam em matéria narrativa, mostrando como temas aparentemente simples podem evoluir para histórias mais complexas.
A opção E) é a correta porque reconhece essa progressão do pensamento machadiano: primeiro a problematização sobre as origens do gênero, depois a apresentação dos elementos que o compõem (as conversas, os temas cotidianos, a transformação do trivial em literário) e, finalmente, a conclusão que sintetiza essa reflexão.
Diferentemente das outras alternativas, que interpretam o fecho como desconexo, meramente estilístico ou sintaticamente inadequado, a opção E) compreende que a frase final está perfeitamente integrada ao desenvolvimento da ideia central do texto, servindo como coroamento da reflexão sobre a natureza e origem da crônica.
Assim, Machado de Assis demonstra, tanto na forma quanto no conteúdo, as características essenciais do gênero cronístico: a aparente simplicidade que esconde uma construção cuidadosa, a transformação do cotidiano em literatura, e a capacidade de extrair significado profundo das situações mais corriqueiras.
Questão 52
Não posso dizer positivamente em que ano nasceu a crônica; mas há toda a probabilidade de crer que foi coletânea das primeiras duas vizinhas. Essas vizinhas, entre o jantar e a merenda, sentaram-se à porta, para debicar os sucessos do dia.
Provavelmente começaram a lastimar-se do calor. Um dia que não pudera comer ao jantar, outra que tinha a camisa mais ensopando que as ervas que comera. Passar das ervas às plantações do morador fronteiro, e logo às tropelias amatórias do dito morador, e ao resto, era a coisa mais fácil, natural e possível do mundo. Eis a origem da crônica
(ASSIS, Machado de. As Cem Melhores Crônicas Brasileiras. Objetiva Rio de Janeiro, 2007, p. 27).
Quando Machado de Assis afirma que “foi coletânea das primeiras duas vizinhas”, ele estabelece que o gênero cronístico :
- A)nasceu de uma comparação entre os fatos banais e os acontecimentos significativos.
- B)trata-se de uma narrativa de acontecimentos circundantes e cotidianos.
- C)originou-se nas sondagens,nas inseções às instnâncias íntimas das criaturas humanas
- D)promove uma associação entre os fatos reais e as fantasias.
- E)é parecer em minúcias de acontecimentos relevantes e em evidência.
A alternativa correta é B)
No trecho apresentado, Machado de Assis traça uma origem pitoresca e cotidiana para a crônica, sugerindo que ela nasceu da conversa despretensiosa entre duas vizinhas. Ao afirmar que "foi coletânea das primeiras duas vizinhas", o autor estabelece que o gênero cronístico está intimamente ligado à narração de acontecimentos comuns do dia a dia, compartilhados em um tom informal e próximo.
A alternativa correta, B, afirma que a crônica "trata-se de uma narrativa de acontecimentos circundantes e cotidianos", o que está em perfeita sintonia com a explicação de Machado. As vizinhas, em seu diálogo banal, discutem desde o calor até as plantações do vizinho e suas aventuras amorosas, transformando o trivial em matéria narrativa. Essa é justamente a essência da crônica: capturar o ordinário e elevá-lo à condição de texto literário, sem a necessidade de grandes eventos ou dramas.
As outras alternativas não correspondem à visão apresentada no texto. A crônica, nessa perspectiva, não se trata de comparações entre banalidades e grandezas (A), nem de sondagens íntimas (C), muito menos de associações entre realidade e fantasia (D) ou de minúcias sobre eventos relevantes (E). O que Machado descreve é um gênero que nasce da observação do cotidiano, do registro do que está ao redor, transformando a simples conversa de vizinhas em uma forma de arte.
Questão 53
Assinale o exemplo de personagem interiormente cindida e contraditória, cuja estrutura moral se esquiva a classificações muito rígidas, como a que se estabelece a partir das noções típicas de bem e mal.
- A)Chicó
- B)Brás Cubas
- C)João Romão
- D)Brísida Vaz
- E)Rita Baiana
A alternativa correta é B)
Assinale o exemplo de personagem interiormente cindida e contraditória, cuja estrutura moral se esquiva a classificações muito rígidas, como a que se estabelece a partir das noções típicas de bem e mal.
- A) Chicó
- B) Brás Cubas
- C) João Romão
- D) Brísida Vaz
- E) Rita Baiana
O gabarito correto é B) Brás Cubas.
Questão 54
“É a partir do Realismo, principalmente, que começa a ter maior presença na literatura a figura do herói problemático, o tipo de herói que predomina na literatura atual. Diferente do herói romanesco – aquele cuja força e coragem superam as das pessoas comuns –, o herói problemático normalmente é o ser humano na sua pequenez, cheio de fraquezas, manias e incertezas diante de um mundo no qual se sente deslocado” (CEREJA & COCHAR, 2003, p. 254). A partir desse apontamento em torno do herói problemático, analise os comentários que seguem:
I. Em “[…] Abraçados, como um casal de noivos em plena luxúria da primeira coabitação… Ao pensar nisso, Bom-Crioulo sentia uma febre extraordinária de erotismo, um delírio invencível de gozo pederasta… Agora compreendia nitidamente que só no homem, no próprio homem, ele podia encontrar aquilo que debalde procurara nas mulheres” (Bom-Crioulo, capítulo IV), é possível dizer que, além de uma identidade não totalmente formada, mas em processo, esse herói problemático, Amaro, sofre também a intolerância social porque “nunca se apercebera de semelhante anomalia”.
II. A anomalia de que fala o narrador da ficção, referindo-se ao comportamento homoafetivo de Amaro por Aleixo, restringe a prática ou o exercício cultural da sexualidade a apenas um modelo ou experiência da relação a dois: o heterossexual, valor que corrobora o universo da ficção naturalista, expositora dos “modelos” e dos “desvios” ou “transgressões” das “normas”.
III. Amaro não pode ser considerado um herói problemático porque ele supera os preconceitos com os quais convive, relacionando-se afetivamente com o seu companheiro, Aleixo, vencendo todas as batalhas culturais que poderiam interpretá-lo como menor, inferior, doente, anormal, como sugere o discurso presente nesta ficção ou conforme era interpretado o gay na sociedade do século XIX.
Está(ão) correta(s) a(s) proposição(ões)
- A)I e II, apenas.
- B)I, II e III.
- C)II e III, apenas.
- D)I e III, apenas.
- E)I, apenas.
A alternativa correta é A)
O trecho apresentado sobre o herói problemático, conforme discutido por Cereja & Cochlar (2003), destaca a figura do protagonista marcado por fragilidades e conflitos internos, distanciando-se do herói tradicional dotado de qualidades excepcionais. A análise das proposições sobre Amaro, personagem central de Bom-Crioulo, permite compreender como ele se enquadra nessa categoria e como sua trajetória reflete as tensões sociais e culturais de seu tempo.
A proposição I está correta, pois Amaro, de fato, representa um herói problemático: sua identidade está em construção, e ele enfrenta a intolerância social devido ao seu desejo homoafetivo, algo que ele próprio não compreende inicialmente como uma "anomalia". Essa angústia e o deslocamento diante das normas vigentes são características centrais do herói problemático.
A proposição II também está correta, uma vez que o narrador naturalista expõe a sexualidade como um campo de normas e desvios, reforçando o modelo heterossexual como padrão e marginalizando outras formas de afeto. A obra, ao retratar o comportamento de Amaro como uma "anomalia", reflete os valores da época, que patologizavam relações homoafetivas.
Já a proposição III está incorreta, pois Amaro não supera plenamente os preconceitos sociais. Embora ele viva sua relação com Aleixo, o texto deixa claro que essa experiência é marcada por conflitos e pelo peso da marginalização. A narrativa naturalista não apresenta uma vitória definitiva do personagem, mas sim sua luta em um ambiente hostil, o que reforça sua condição de herói problemático.
Portanto, as proposições corretas são I e II, conforme indicado na alternativa A.
Questão 55
Esaú e Jacó, de Machado de Assis, e Os Bruzundangas, de Lima Barreto, são obras representativas das tendências estéticas realistas e pré-modernistas, respectivamente. Desse modo, ambas
- A)apresentam uma visão positiva sobre o trabalho escravo no Brasil.
- B)defendem a religiosidade como base para o progresso humano.
- C)realizam uma crítica ao regime republicano brasileiro
- D)representam o índio como herói nacional.
A alternativa correta é C)
O ensaio a seguir analisa as obras Esaú e Jacó, de Machado de Assis, e Os Bruzundangas, de Lima Barreto, destacando suas críticas ao regime republicano brasileiro, conforme indicado na alternativa correta (C).
Ambas as obras, embora pertencentes a momentos distintos da literatura brasileira — o Realismo e o Pré-Modernismo —, compartilham um olhar crítico sobre as estruturas políticas e sociais do Brasil. Em Esaú e Jacó, Machado de Assis utiliza sua prosa irônica para explorar as contradições da elite brasileira durante a transição do Império para a República. A narrativa, centrada nos gêmeos Pedro e Paulo, simboliza as divisões e os conflitos ideológicos da época, revelando as falhas e hipocrisias do novo regime.
Já em Os Bruzundangas, Lima Barreto satiriza de forma ainda mais direta e ácida a República brasileira, retratando-a como uma nação fictícia repleta de vícios políticos, corrupção e incompetência administrativa. Seu estilo pré-modernista, marcado por uma linguagem coloquial e engajada, expõe as mazelas de um sistema que perpetuava desigualdades e privilegiava os interesses das elites em detrimento do povo.
Portanto, a alternativa C está correta, pois ambas as obras realizam uma crítica contundente ao regime republicano, cada uma à sua maneira. Machado de Assis o faz por meio da ironia e da análise psicológica, enquanto Lima Barreto opta pela sátira e pela denúncia social, antecipando temas que seriam centrais no Modernismo brasileiro.
Questão 56
A linguagem utilizada nos trechos revela um
- A)registro informal no primeiro e um formal no segundo.
- B)registro formal no primeiro e um informal no segundo.
- C)registro informal em ambos.
- D)registro formal em ambos.
A alternativa correta é B)
Nos trechos apresentados de Memórias Póstumas de Brás Cubas, de Machado de Assis, é possível identificar uma diferença marcante no registro linguístico utilizado. O primeiro trecho apresenta um tom mais reflexivo e descritivo, com uma estrutura gramatical mais elaborada, caracterizando um registro formal. Já o segundo trecho, por sua vez, traz um diálogo entre personagens, reproduzindo a fala coloquial e até mesmo o linguajar típico da época, com expressões como "nhonhô" e "bêbado", evidenciando um registro informal.
Essa distinção é fundamental para compreender a dinâmica social retratada na obra, em que a linguagem reflete as hierarquias e relações de poder entre os personagens. Enquanto o narrador, Brás Cubas, utiliza um discurso mais culto e refinado, os diálogos dos escravos ou personagens subalternos são marcados por uma oralidade mais simples e direta, típica do registro informal.
Portanto, a alternativa correta é a B) registro formal no primeiro e um informal no segundo, pois essa análise demonstra a intencionalidade do autor em diferenciar os níveis de linguagem conforme o contexto e os personagens envolvidos.